O ciclo de estudos contemporâneos visa aprofundar aprendizagens, estimulando olhares multidisciplinares sobre o presente histórico.

O segundo dia do ciclo de estudos contemporâneos “Afinar Olhares, alargar ideias”, organizado pelo Departamento de História da Universidade do Minho, aconteceu esta terça-feira, via zoom, e contou com a presença de Sara Barros Leitão. A atriz, encenadora e dramaturga procurou relacionar a sua experiência no mundo das artes performativas e do teatro com o que a história, o património, os arquivos e as teses contribuem para o processo criativo. O mote foi “Criação artística: a História como ferramenta, matéria e reescrita”.

A sessão começou com a exposição de alguns momentos da vida profissional de Sara Barros Leitão que a foram direcionando, ao longo do tempo, para a vertente mais criativa. Como justificação para a mudança apontou para a relação “muito específica” que existia com o que queria investigar, “que não parte tanto de uma vontade de fazer textos que já foram escritos”.

A atriz contou como foi fazer parte da ‘Trilogia das Idades’, três espetáculos que abordavam as juventudes revolucionárias dos anos 50, anos 70 e 90 e o importante papel que a História e os estudos da altura desempenharam. ‘O Grande Tratado da Encenação’, a primeira peça das três, era originalmente um livro que retratava o processo de construção de um espetáculo, mas que foi adaptado, no espetáculo, para o pensamento de um país em liberdade. “Nós remexemos os arquivos, consultámos uma série de documentos e pensámos na forma interessante de como tudo isto pode ajudar a construir uma dramaturgia de raiz”, confessou.

Sara Barros Leitão/ Facebook

Sara Barros Leitão explicou ainda que para se criar uma peça só a partir de uma ideia, é preciso criar um esqueleto de um espetáculo, ou seja, como é que começa, por onde é que a história passa e como acaba, e depois começar a preencher. Esse recheio consiste em improvisações dos atores, com base em formações que receberam, em artigos e documentos que leram e em entrevistas que fizeram. “E este momento de mesa pode ser muito partilhado com o lado de produção de pensamento, com um lado mais sério na forma de trabalhar os materiais e pode ser uma relação muito maravilhosa”, continuou a atriz.

A atriz revelou o processo de trabalho para encenar a peça ‘Todos os Dias me Sujo de Coisas Eternas’ que consistiu num estudo da toponímia portuense. Interessou-se por este tema devido ao facto de saber alguns nomes de ruas, mas nunca a origem dos mesmos e a história de cada pessoa que lhes dá nome. Ao longo da investigação que fez, conseguiu perceber que apenas uma quantidade muito residual de ruas tinham nomes de mulheres e que nenhum nome feminino era precedido de uma profissão ou título importante. Do mesmo modo, olhou para a estatuária da cidade e constatou que a maioria era de figuras masculinas, “bem vestidas”, com a identificação e com a figura a olhar para cima. Em oposição, as estátuas femininas eram em menor quantidade, com as mulheres sem identificação, nuas e a olhar para baixo.

Juntamente com algumas perguntas dos que assistiam, a sessão encerrou com uma reflexão sobre o papel das artes na mobilização de uma sociedade e sobre a relevância de uma relação entre os trabalhos já feitos pelos teóricos com o processo criativo.