A banda Malaboos vai lançar o novo álbum Nada Cénico, esta sexta-feira, dia 28 de maio. O grupo é composto por três elementos: Diogo Silva, na voz e guitarra, Ivo Correia, na bateria e Rui Jorge, no baixo. O ComUM esteve à conversa com Diogo Silva para melhor conhecer o projeto e o disco que está a caminho.
ComUM – Porquê Malaboos?
Diogo Silva – Acho que Malaboos é uma palavra bastante particular. Para além de ficar no ouvido, é uma palavra interessante de ser lida e de ser dita e existem sempre pessoas que dizem o nome de forma diferente, o que acho engraçado. Eu criei este projeto há cinco anos e na altura foi quando estava a começar a explorar mais a guitarra e a ver que eu aprendia mais música e me conseguia exprimir melhor a criar a minha própria música e não a tocar a dos outros. Então, foi isso que fiz, comecei a compor algumas coisas e senti a necessidade, porque já tinha algumas músicas feitas, de dar um nome ao projeto. Na altura não queria chamar Diogo Silva. Numa saída à noite, a apanhar borracheira e a filosofar sobre o meu ser criativo com a guitarra, surgiu-me o nome Malaboo.
Mais tarde, arranjei companheiros para o projeto e começamos a tocar todos juntos e eu lembrei-me de lhes dizer este nome, toda a gente curtiu e ficou. Depois também levou para outros caminhos, porque a palavra Malaboo também é um tipo de bebida americana, tipo moonshine, tipo um bagaço, é a gíria usada numa região especifica. É também uma tribo, cujo nome não é bem como se escreve Malaboo, mas que se escondeu na floresta porque não estavam contentes com o que a sociedade se estava a tornar. Eu achei isso super interessante.
ComUM – Do Matuta para o Nada Cénico, deixaram de contar com a participação da Margarida como vocalista. Achas que se tornou mais difícil criar com menos um elemento na banda?
Diogo Silva – Desde o início da criação do projeto que sou sempre eu que trago para a sala de ensaio a progressão harmónica, a melodia, os riffs, às vezes até letra, outras vezes venho com canções feitas, com tudo já estruturado. Acontece, apesar de serem raras as vezes, de criarmos em grupo, que é uma magia completamente diferente de ser uma música pensada em casa.
No Matuta as músicas já estavam todas feitas quando o Rui, a Margarida e o Ivo se juntaram. Estava tudo preparado, faltava, como é obvio, dar o cunho pessoal de cada um e limar um bocadinho algumas músicas. Foi isso que fizemos, participaram todos a mudar algumas partes de músicas, a fazer mais letra, esse tipo de coisas. A Margarida participou na criação de algumas músicas e estava presente quando as finalizamos. Sempre fizemos as coisas desta maneira, mas na desportiva e, quando a Margarida decidiu, por bem, que não queria fazer mais parte do projeto (amigos à mesma, claro), nós tivemos que mudar a estratégia porque nos não somos cantores.
Malaboos dá sempre muita importância ao instrumental, dando importância a cada instrumento e a voz é um desses componentes. Quisemos que a voz continuasse a ter o mesmo papel, mas como não somos cantores, tivemos que nos adaptar. Como a raiva do Rock N’ Roll já estava dentro de nós, foi um bocado fácil. Já tínhamos as letras, sabíamos muito bem o que queríamos fazer, as mensagens que queríamos passar com cada música. Houve algumas músicas que foram criadas logo após a saída da Margarida, até um bocado com a ideia de podermos explorar mais o instrumental e meter voz só nos momentos em que alguma coisa tem de ser dita. Foram quatro ou cinco meses de preparação para ter as músicas todas direitas e preparadas para levar para o estúdio e mais três meses de gravação e edição para as coisas ficarem como nós queríamos.
ComUM – Há uma notável evolução no vosso som neste novo álbum. Achas que isso transmite a vossa evolução, não só como pessoas, mas como banda?
Diogo Silva – Sim, acho que é um álbum muito mais crescidinho. Não é que os outros não fossem, mas acho que este tem muito mais substância, demos muito mais de nós, até porque no Matuta já tínhamos as coisas muito mais definidas. Este contributo foi de todos, foi diferente, foi muito mais humano, estávamos todos a sentir as músicas, cada batimento da composição e da criação e do lado da imagem que queríamos passar e do sonho que estava a existir.
Foi um período mais difícil, porque temos todos um sonho, que é conseguir tocar a nossa música e que as pessoas gostem da nossa música e que seja uma experiência agradável. Nós ouvíamos a música quando estávamos a criar de uma maneira que as outras pessoas não ouvem, então fizemos tudo para tentar mostrar às pessoas a música que estávamos a criar da melhor forma possível, com o maior esforço e dedicação que pudéssemos, queríamos que as pessoas fossem capazes de sentir emoções. Tínhamos muita música para fazer e, para isso, dedicamo-nos de corpo e alma para fazer que o álbum fosse uma viagem que, desde o primeiro segundo, envolvesse as pessoas e que elas se sentissem felizes.
ComUM – Achas que a pandemia vos afetou ao nível da criação musical?
Diogo Silva – Não, porque trabalhar à distância é algo que sempre fizemos, cada um fazer a sua parte e mandar para os outros, por aí fora, é algo a que já estamos habituados. Com a Covid, as coisas continuaram assim, apesar de ter havido uma quebra enormíssima no tempo que passávamos juntos, mesmo sendo todos de Viana do Castelo. Não podíamos estar a correr riscos, então só ensaiávamos esporadicamente, mas tínhamos um contacto quase diário na criação, em fazer as demos e experimentar coisas. Já sabíamos bem o que queríamos, então deu para relaxar um bocado, fazer as cenas com calma e, ao mesmo tempo, focarmo-nos em nós. Deu para cada um de nós explorar os seus projetos, para compor.
Eu, pessoalmente, estive a fazer algumas coisas para mim, a estudar e a compor, o Ivo a trabalhar com outros projetos e a fazer coisas para ele e o Rui basicamente a mesma coisa. Isso foi bom, porque conseguimos adiantar aquelas coisas que estavam em segundo plano. Como a vida social foi totalmente cortada, tivemos mais tempo para nos dedicarmos a nós e à música. Claro que a indústria parou, o que foi um misto de emoções, porque por um lado tínhamos tempo para nós e para fazer as coisas, mas por outro não podíamos fazer aquilo que gostamos, que é tocar, não podíamos apresentar o nosso trabalho e o circuita estava todo fechado, o que estava a criar um pouco de instabilidade mental, para nós e para toda a gente. Mas continua a ser frustrante, as coisas não melhoraram e nós sabemos que foi um risco enormíssimo estarmos a lançar um álbum em tempo de pandemia, mas não podemos parar, a música não pode parar, a cultura não pode parar.
ComUM – Quais são as tuas maiores influências?
Diogo Silva – Eu sempre ouvi bastante de tudo, desde as primeiras referencias do Blues, Freddie King, B.B. King, Albert King, os kings todos. Sempre me interessei em Joni Mitchell porque é uma deusa. Quando era pequeno, o meu pai sempre fez questão de me mostrar alguns discos de jazz, então eu conhecia o Herbie Hancock, que inicialmente eu perguntei ao meu pai se ele era guitarrista, pela maneira como ele tocava piano, que era muito à frente.
Isso foi aquela base, eu ainda não tocava, mas já os tinha presentes na minha cabeça. Depois foi Ornatos e Toranja, Chocalhos. Bandas portuguesas sempre fizeram parte das viagens de carro. A música portuguesa sempre esteve presente na minha vida desde cedo e sempre foi muito importante porque eu consegui, de facto, percebê-la. Música inglesa eu não conseguia perceber e o que era música improvisada eu conseguia sentir, mas não conseguia percebê-la muito bem na altura.
Quando comecei a tocar foi quando comecei a descobrir os grandes improvisadores, a descobrir bandas como Radio Head, a ouvir Tool, a ter de ouvir de tudo, mas que geralmente duravam dois, três meses, porque eu comia tudo dessas bandas e depois mudava de gostos e de bandas. Mas uma coisa que sempre ficou nas minhas playlists foi a música improvisada e música experimental. Mais recentemente, é uma mistura de jazz, com fusão, com punk e rock pastilha. Não sei isto faz sentido, mas é tentar casar o melhor dos mundos e tentar criar uma identidade própria. Também é bastante fácil fazer isso com o projeto que nós temos, visto que eu tenho este background um bocado mais delicado, no sentido de ouvir música mais limpa, o que faz com que seja uma coisa mais certinha. Já o Ivo, vem de um registo muito mais pesado, mais metal e o Rui vem de uma cena muito mais rock, uma cena sempre com batida.
Juntamo-nos numa ideia de que há músicas e bandas que não têm um género e mesmo, que não se goste, é possível ouvir e dizer que é bom. Encontramo-nos todos aí, é altamente casarmo-nos neste contexto, porque temos ideias e abordagens diferentes da música e, quando chega alguma coisa que na minha cabeça é suposto ser uma balada, entrego-lhes o material e cada um faz a sua cena. Claro que nos chateamos, como é lógico, mas depois quando conseguimos ceder e abdicar de alguma coisa, para começar o ato da criação e estamos ali os três a negociar, acaba por ser uma conversa interessante que passa por muitas influências e é muito bonito.
ComUM – Se pudesses escolher um artista, vivo ou morto, com que pudesses colaborar, quem seria?
Diogo Silva – Sem dúvida, com o Manuel Cruz. Gostava que fosse com os Ornatos, mas não sei se isso é possível. Se fosse só com um elemento, seria o Manel, sem tirar mérito ao resto da banda, mas é porque eu não conheço tão bem a nível individual. O O Monstro Precisa de Amigos é um velho amigo meu. A música de Ornatos Violeta acompanhou-me muito na minha adolescência e pré-adolescência. É um álbum intemporal, é música intemporal, é escrita intemporal. Não querendo fazer uma coisa igual, de todo, mas, por ter um orgulho enorme neste álbum e nesta banda, é que gostava de trabalhar com o Manel Cruz. Tentava fazer uma coisa mais ou menos igual, não no som, mas na carga emocional das músicas de Ornatos, porque eu não conheço quem não goste de Ornatos, a quem aquela música não traga emoção.
Tem músicas no Monstro que tenho a certeza de que são para mim. É aquele cliché básico, mas na arte há destas coisas, de um gajo ouvir e achar que é mesmo isto que eu estava a pensar, é mesmo isto que eu estava a sentir. O Monstro Precisa de Amigos transporta-me para esse universo e é isso que eu ambiciono na música, fazer música que dure.
ComUM – No dia 14 de maio tiveram o primeiro contacto do novo álbum com o público. Como é que foi a recessão ao novo trabalho?
Diogo Silva – Foi magnifico. Foi a primeira vez que atuamos com o Nada Cénico. Foi a primeira vez que pudemos mostrar a nova imagem, o novo espetáculo, a nova atitude. Estávamos um bocado nervosos, porque queríamos tocar e já não tocávamos há tanto tempo. Foi muito bom poder fazer esta estreia na casa em que Malaboos cresceu. Sempre apresentei lá todos os álbuns, o Doutor Nuno é uma jóia de pessoa, sempre nos apoiou imenso e contribuiu para o crescimento da banda, logo, fazia todo o sentido que o concerto de apresentação fosse lá. Claro que estava alto, mas faz parte desta nova cena, que é tocar música alta e estourar. É uma coisa diferente, consegue meter o pessoal num transe diferente. Sempre tive essa ideia de que quando a música é alta – quando não chega a ser poluição sonora – parece que as ondas sonoras entram em contacto com a tua pele e vibras muito mais.
A malta curtiu das novas músicas, da nova abordagem, da nova imagem. Pelo menos a ideia com que fiquei e pelo feedback que me deram, foi um concerto fixe para ver. Deu para libertar um bocado de raiva, para bater um bocado o pé, mas também para estar um bocado mais relaxados. Foram 45 minutos de uma viagem em que as pessoas se esqueceram da vida, mesmo estando de máscara. Para mim, isso foi maravilhoso, não só por ser um concerto de Malaboos, mas por estar a acontecer um evento. Estávamos mesmo felizes e a malta no fim do concerto estava muito animada com o que tinha acontecido. Agora esperámos poder partilhar a experiência que aconteceu em Arcos de Valdevez com o resto do país e, talvez, com o resto do mundo.
ComUM- Há planos para o futuro?
Diogo Silva – É um bocado estranho, porque agora não há definir planos, acontece qualquer coisa e vamos para casa três meses. O que está a acontecer é que temos tido um feedback muito bonito dos singles que temos lançado. Estamos a viver um dia de cada vez, a tentar fazer chegar a nossa música a todos os sítios possíveis e imaginários e ver o que pode sair daí. Não temos planos definidos, mas sabemos que queremos apresentar o Nada Cénico em força e que vamos fazer de tudo para conseguir apresentá-lo em todo lado.
Tanto o Ivo como o Rui foram e são um apoio enorme neste projeto, na imagem que estamos a criar. Temos também a ajuda do Rui Santos, que nos dá apoio nos concertos ao vivo, que é um amor de pessoa que nos dá apoio na guitarra secundária, sintetizadores e voz, porque, lá está, só sabemos curtir, não somos lá muito bons cantores. As músicas são todas muito diferentes umas das outras, é uma viagem com muita dinâmica, muitos altos e baixos, muita tensão. É música forte, que nós não categorizamos em nenhum estilo específico, cada música é uma música e transmite sensações diferentes.