Após o sucesso de bilheteira de Um Lugar Silencioso I (2018), estreou nos cinemas portugueses, em maio, uma das sequelas de terror e ficção científica mais aguardadas do ano. Sem recorrer ao mesmo silêncio tenso e agonizante do primeiro filme, esta segunda parte continua a seguir os passos cuidadosos da família Abbot na constante luta pela sobrevivência.

Desta vez, estamos já familiarizados com as abomináveis criaturas que, lentamente, ceifam a vida humana da terra. Evelyn acaba de dar à luz, está viúva e perdeu um dos seus filhos. É deste modo que começa Um Lugar Silencioso II, dando continuidade ao clímax trágico do primeiro filme. A mulher e os seus três filhos abandonam a quinta que, outrora, representava segurança e aconchego, vivendo o mais próximo da realidade que era possível. Acompanhamos, por isso, o trajeto da família Abbot pelo desconhecido, em busca de abrigo. No caminho, surgem novas ameaças que podem ser tão tenebrosas quanto os “caçadores de som”.

Enquanto que na primeira parte da sequela apenas conhecíamos a existência da família e da quinta que habitavam, o diretor, John Krasinski, dá-nos agora uma extensa panorâmica do cenário pós apocalíptico. Novos cenários, novas personagens e muita mais ação, que se traduzem numa perda relevante do silêncio constante a que fomos acostumados. A sonoplastia torna-se mais ruidosa e brusca, em prol da agitação da narrativa. O anterior ambiente de tensão, o pavor das próprias respirações das personagens ou o desconforto do simples som dos seus passos, despertava maior suspense ao espectador. Com isto, o enredo perde a originalidade minimalista da primeira parte e o terror desapodera-se da subtileza e ineditismo iniciais.

Um Lugar Silencioso 2 singra mais pelo género da ação e orienta-se num ritmo mais frenético. Vemos mais lutas físicas, mais resgates, mais perseguições. Durante 97 minutos, acelera-nos o coração e faz-nos movimentar no assento, causa inquietação e desperta a adrenalina.

No entanto, a ligação entre as duas obras bastante bem concebida. Vários planos de câmara, ao longo da longa-metragem, mostram pormenores que nos transportam a acontecimentos passados e fomentam a veracidade da sucessão linear de eventos. O prego nas escadas que remete à narrativa passada, por exemplo, continua presente nesta parte. Apesar dos novos cenários desertos e degradados, das personagens alteradas, física e psicologicamente, pela catástrofe apocalíptica, as referências ao primeiro filme não cessam. Relembram os mais esquecidos e realçam a relevância de todos os momentos enfrentados pelos protagonistas.

Por sua vez, uma das grandes novidades de Um Lugar Silencioso 2 é a participação de Cillian Murphy, que interpreta o papel de Emmet, antigo amigo dos Abbot e sobrevivente da tragédia. O ator representa um homem absorvido pela solidão e pela perda, alguém quase corrompido pelo egoísmo que a ânsia de sobrevivência provoca. Contudo, acompanhamos a sua mudança, enquanto personagem, e vemos os seus sentimentos renascerem, especialmente com o desenvolver da sua relação de cumplicidade com Regan (Millicent Simmonds).

Destaco, por fim, a boa representação da ordem dos acontecimentos, nomeadamente nas cenas de maior tensão. Uma vez que as personagens estavam separadas, sucederam-se alternâncias entre o relato de diferentes acontecimentos, de modo a sugerir que as ações decorriam simultaneamente. Através desta técnica, era possível visualizar, “em tempo real”, as distintas intervenções das personagens.

Assim, Um Lugar Silencioso 2 não se sobrepõe à primeira obra cinematográfica, mas dá-lhe a continuidade devida. Apesar deste roçar mais no convencional, John Krasinski volta a brindar-nos com um novo e arrojado sabor de terror.