Estudantes de Medicina tem início de aulas antecipado e horários que mudam semanalmente.

Com o verão a chegar ao fim, a generalidade dos alunos da Universidade do Minho ainda tem quase um mês de férias, com as aulas da grande maioria a começarem no dia 4 de outubro. Contudo, o mesmo não acontece para os estudantes de Medicina: com exceção dos alunos do primeiro ano que começam dia 4 de outubro, os do terceiro, quarto, quinto e sexto ano iniciam o ano letivo dia 6 de setembro, segunda-feira, e o segundo ano dia 20 de setembro. O ComUM esteve à conversa com professores e alunos da Escola de Medicina para tentar perceber o porquê desta situação.

Nuno Sousa, presidente da Escola de Medicina da Universidade do Minho, justificou o início precoce das aulas com o facto de ter que existir uma articulação entre a universidade e as instituições prestadoras de cuidados de saúde onde os estudantes têm que fazer “formação em contexto de trabalho”. Segundo o professor, esta decisão é tomada com grande antecedência, de modo a coincidir com os períodos em que haja mais pessoas a trabalhar, garantindo as melhores condições para a formação dos estudantes.

Marisa Coelho, presidente do Núcleo de Estudantes de Medicina da Universidade do Minho (NEMUM), acredita que este início precoce se relaciona com o facto de o curso ter uma organização diferente (é constituído por três trimestres, em vez dos habituais dois semestres). “O nosso horário é quase como o secundário: temos o primeiro período, que são os primeiros três meses, depois o segundo e o terceiro”, explica, reforçando a ideia de que as aulas começam mais cedo para conseguirem “coincidir dentro destes períodos”.

Para Catarina Silva, aluna do terceiro ano, este início de aulas antecipado “em termos educacionais, acho que pode ser benéfico, porque, pelo menos com estes anos de pandemia, nós perdemos muito a parte prática, por causa do confinamento, e acho que o facto de começarmos mais cedo pode ajudar a colmatar um bocadinho essa falta de aulas que nós tivemos”. Também Maria (nome fictício), outra estudante de Medicina entrevistada pelo ComUM, se mostra bastante recetiva ao início prévio das aulas, quanto mais não seja porque “depois acabo as aulas mais cedo, e também gosto disso”.

Marisa Coelho também não vê no início antecipado das aulas de Medicina um problema. A aluna explicou que os estudantes já não olham para essa questão nem nunca se manifestaram sobre esse assunto. “Sinceramente, claro que, se calhar, nós até preferíamos que as aulas começassem duas semanas mais tarde, mas que tipo de implicações é que isso ia ter? Se calhar, as implicações iam ser termos mais carga de trabalho, ou coisas mais compactadas”, declarou. Nuno Sousa afirmou também que este início precoce permitirá que os alunos “aprendam, adquiram e treinem o conjunto de competências que têm que apreender”.

Por outro lado, o único ponto referido como negativo face ao início de aulas precoce é a vida social, que fica comprometida. Tanto no caso de Marisa Coelho como de Maria, cujas férias muitas vezes não coincidem com as dos amigos. Já Catarina Silva referiu que, para si, a maior desvantagem prende-se com o facto de viver com colegas de outros cursos, que só começam as aulas daqui a um mês: “quando chego a casa da universidade, ter pessoas com quem conversar, com quem desabafar e partilhar o meu dia acaba por ser o meu refúgio”, afirmou, acrescentando que este mês, que vai estar sem as colegas de casa, vai ser mais complicado.

Todavia, o presidente da Escola de Medicina afirma que os alunos mostram uma concordância muito elevada acerca das aulas antecipadas: “a esmagadora maioria dos estudantes são muito responsáveis, muito determinados, inteligentes e portanto sabem bem quais são os seus objetivos pessoais e trabalham para conseguir atingi-los”, reiterou, acrescentando que “os alunos, além de serem informados, também são ouvidos”.

No entanto, esta ideia é contrariada por Maria, que afirmou que a escola nunca dialogou com os alunos nem explicou o porquê destas decisões: “existe a possibilidade de darmos feedback no fim de cada módulo, mas nunca nada muda, a menos que seja algo muito escandaloso”.

No que toca ao novo programa curricular e aos horários, “o novo programa curricular foi implementado pela primeira vez no ano passado, em apenas alguns anos”, explica a presidente do núcleo de Estudantes de Medicina da UMinho. Marisa Coelho esclarece que o curso se encontra numa fase de mudança entre o programa antigo e o novo programa. “Estavam no novo programa o primeiro e o quarto ano”, continua, clarificando que, com o surgimento de cada ano letivo, acrescenta-se um ano curricular ao novo programa.

Segundo Marisa Coelho, os alunos de Medicina não têm um horário definido, uma vez que este se altera todas as semanas. No entanto, não aponta nenhum potencial efeito na vida dos estudantes, uma vez que, além de os horários serem disponibilizados desde o início do ano e com até três meses de antecedência, acha “que é uma questão de hábito”. Contudo, admite que possa gerar dificuldades para alunos inscritos em atividades extracurriculares: “claro que, por exemplo, para atividades extracurriculares torna-se um bocadinho difícil de gerir. Se nos quisermos inscrever numa atividade extracurricular que seja, por exemplo, às segundas, não podemos, porque não sabemos se em todas as segundas à tarde estamos livres”. Ainda assim, afirmou que o núcleo nunca recebeu qualquer feedback dos estudantes relativamente a este assunto.

Em contrapartida, para Maria o horário semanalmente diferente é a pior parte do curso: “eu não consigo marcar uma consulta com grande antecedência sem ter que pesquisar na plataforma, com um tablet e um telemóvel ao mesmo tempo, para tentar encontrar um buraco no meu horário”, exemplifica, estendendo esse desconforto e instabilidade também à vida social, que fica extremamente limitada. Esta opinião é partilhada pela colega Catarina Silva, que acrescenta a este o facto de o horário ser extremamente heterogéneo: “nós temos dias em que entramos às 9h e saímos às 19h30 e uma pessoa que tenha atividades certinhas, não vai estar sempre a faltar porque o horário é diferente”, explica. Para Maria, “nem é tanto o tempo de aulas que se tem, é não haver uma organização homogénea”, afirma.

Por fim, questionadas acerca de uma eventual e possível intervenção do núcleo, Maria confessa que, no curso, impera um certo medo de criar conflitos, motivado pelo facto de “a maioria dos alunos que entram em Medicina estar habituada a ser o melhor aluno da turma ou da escola, de quem os professores gostam muito e que não cria grandes ondas por precisar de boas notas, o que se reflete na universidade e no resto da vida deles”. “A maior parte das pessoas já está tão cansada entre preparar aulas, ir às aulas, estudar para os exames, que não se tem grande tempo para se estar a discutir se as aulas deviam ser mais de manhã, ou se deviam ser mais distribuídas. As pessoas só aparecem”, conclui.