A adaptação da obra vicentina é um combate ao racismo e ao sexismo.

Na passada sexta-feira, dia 19 de novembro, o Teatro Diogo Bernardes recebeu a peça do Teatro Nacional D. Maria II “Pranto de Maria Parda”, num formato totalmente distinto e com rimas à mistura. Com encenação de Miguel Fragata, a obra de Gil Vicente foi comparada à atualidade, mais concretamente ao ano de 2021. Assim, culminou em duas realidades em que o objetivo é sacudir o que é mau.

A peça centrou-se em Maria Parda, interpretada por Cirila Bossuet, que vagueia pelas ruas de Lisboa num intervalo de tempo de 500 anos. Se, em 1521, Maria Parda não reconheceu a cidade que estava devastada pela fome, seca e peste, sendo ela uma mulher alcoólica sem lugar na cidade, em 2021, Maria Parda continuou sem ter espaço, agora numa Lisboa irreconhecível, arrasada pela longa pandemia. Em suma, 500 anos depois, o ano continuou devastado com pessoas a serem deixadas de lado.

Foi ainda abordada a insinuação de que Maria Parda fosse uma mulher negra. Com o passar dos séculos, a personagem foi passando de “mulher branca”, a “mulher mestiça” e, atualmente, a “mulher negra”. Gil Vicente escolheu uma figura feminina para representar o “ano mau”, mas em nenhum momento pareceu indicar na obra que se tratasse de uma “mulher negra”.

Desta forma, Miguel Fragata decidiu dar voz a várias questões, mais especificamente ao racismo e ao sexismo, através do rap. Ao contrário de Gil Vicente, que recorreu às redondilhas, esta adaptação abraçou as rimas de Capicua e Xullaji para abordar temas fortes que foram ouvidos ao longo do espetáculo teatral.