A abstenção tem vindo a aumentar ao longo das últimas legistativas.
Em 2019, com 51,4% bateu recordes. Na última vez que os portugueses foram às urnas para eleger os deputados da Assembleia da República, a abstenção, caso fosse tida em conta para o número de deputados, tinha sido a vencedora. José Palmeira, professor no Departamento de Ciência Política da Escola de Economia e Gestão da Universidade do Minho, acredita que o aumento do número de partidos com representação parlamentar e a informação disponível nos meios de comunicação social pode contribuir para a diminuição da abstenção.
A taxa de abstenção, desde 1975, tem vindo a subir ao longo dos anos. “Desde logo que temos de ter em atenção o seguinte: uma parte da dita abstenção é fictícia. Não é real”, explica, ao ComUM, José Palmeira. Atualmente, qualquer pessoa a partir dos 18 anos, que tenha cartão de cidadão, pode votar automaticamente.
José Palmeira acrescenta que a abstenção também abrange os emigrantes. “Estima-se que haja cerca de um milhão e meio que está em condições de votar. No entanto, devido ao afastamento que têm do país, ou porque já são emigrantes de várias gerações, muitos deles não se sentem tão bem informados sobre o que se passa no país e, portanto, não estão tão estimulados para votar”. De acordo com o Diário de Notícias, há 1.143.604 eleitores indicados pela Comissão Nacional de Eleições (CNE) mas que não podem votar, como é o caso das pessoas falecidas e dos emigrantes que continuam recenseados em Portugal.
O docente declara que a taxa de abstenção é “muito inferior ao valor que é divulgado no dia das eleições” e aponta o descontentamento como um dos principais fatores. “Há pessoas descontentes com o sistema, que acham que os partidos e os políticos são todos iguais e, portanto, desinteressam-se pela atividade política”. Por outro lado, José Palmeira refere que, entre os eventuais abstencionistas, ainda existem “aqueles que tanto lhes faz quem seja o Governo, porque nada os afeta”.
Nas primeiras eleições em democracia, realizadas em 1975, registou-se o número mais baixo de abstenção até ao momento (8,6%). A politóloga Marina Costa Lobo, num artigo de opinião do jornal Público, explica que esta elevada participação eleitoral foi o “reflexo do entusiasmo com o regime democrático, da novidade do sufrágio universal e da liberdade de escolha oferecida pelo boletim de voto”.
A 6 de outubro de 2019, verificou-se um recorde máximo da taxa de abstenção, com 51,4% dos eleitores a não exercer o seu direito de voto. De acordo com Marina Costa Lobo, com esta percentagem, Portugal é dos países da Europa ocidental em que a participação eleitoral mais tem diminuído.
“Dificilmente alguém poderá hoje alegar que é por desconhecimento que não vota”
Considerando os dados provisórios dos Censos 2021, o recenseamento eleitoral contém, pelo menos, um milhão de eleitores-fantasma. Os diferentes cálculos, publicados pelos órgãos de comunicação social, têm apontado para números entre 650 mil e 1,25 milhões de eleitores-fantasma. Deste modo, José Palmeira apoia uma atualização dos cadernos eleitorais. “É muito pouco honesto estarmos na noite das eleições a comentar os resultados e sempre a ‘bater na mesma tecla'”.
Portugal viveu durante “muito tempo” num regime autoritário. “Vimos de uma cultura política passiva e essa cultura política não se muda por decreto. Não é porque em 1975 passamos a ter uma constituição que nos levou para um regime democrático, em que tornou possível a participação, que nós vamos todos a correr para votar”, constata José Palmeira.
“A participação também tem a ver com estímulos e, mesmo em regime democrático, nós não somos muito estimulados a participar. Há poucos referendos e não há um hábito de promover a participação das pessoas, até do ponto de vista cívico”, refere o docente. “O exemplo tem que vir de cima. O estado devia estimular mais a participação das pessoas. Quando não há estímulos à participação, é natural que, do ponto de vista eleitoral, os cidadãos também se sintam desmotivados”, acrescenta.
Um dos factos que José Palmeira aponta que possa ajudar a diminuir a abstenção é “o facto de, agora, as pessoas terem acesso a informação. Seja pelas redes sociais, pelas rádios ou pelas televisões, hoje os cidadãos estão muito mais informados”. “Dificilmente alguém poderá hoje alegar que é por desconhecimento que não vota”, colmata.
No próximo dia 30 de janeiro, ficam-se a conhecer os resultados das Eleições Legislativas, sendo os 230 lugares da Assembleia da República distribuídos, por método de Hondt, pelos partidos concorrentes.
Artigo realizado por: Joana Oliveira, Maria Carvalho e Maria Francisca Barros