Os oito deputados da Iniciativa Liberal, eleitos nas últimas eleições legislativas, iniciam funções na próxima terça-feira.

A 30 de janeiro, os portugueses e portuguesas saíram à rua para escolher os próximos representantes na Assembleia da República. Na próxima terça-feira, quase dois meses depois, acontece a tomada de posse dos 230 deputados eleitos. Entre os partidos que mais cresceram nestas eleições encontra-se a Iniciativa Liberal (IL). Apesar de ter eleito, em 2019, apenas um deputado – João Cotrim de Figueiredo – , o partido conta agora com um grupo parlamentar de oito pessoas.

Miguel Rodrigues, docente de Ciência Política na Universidade do Minho, argumenta que a Iniciativa Liberal veio dar resposta a um eleitorado que não se revia nos partidos já existentes no espetro político português. Aponta que, até à chegada da IL, existiam “partidos liberais na economia” e que pretendiam “reduzir o peso do Estado” e “dar possibilidade à iniciativa privada”, mas que não conseguiam “ser isso e liberais nos costumes”.

Assim, o partido, fundado em 2017, veio preencher este espaço ao defender o “liberalismo em toda a linha”, como afirma Olga Batista, coordenadora geral do núcleo territorial de Braga e membro fundadora do partido.  “Tínhamos a direita a defender a parte económica com o CDS, mas muito conservadora nos costumes. Depois temos uma esquerda muito ligada à liberalização dos costumes, mas a nível económico verdadeiramente estatizante. Só o liberalismo consegue buscar o melhor dos dois mundos”, explicita a coordenadora.

“O conceito principal é a liberdade de escolha”

Tendo como bandeira principal “a maximização da liberdade do indivíduo”, o liberalismo considera que o Estado não deve ter o monopólio dos serviços prestados aos cidadãos. Assim, apesar do governo “continuar a financiar serviços públicos”, estes “podem e devem ser também providenciados por privados”, explica Miguel Rodrigues.

Em contraponto ao socialismo, que defende um Estado “mais paternalista” com a criação de um serviço que “possa servir a toda a gente”, o liberalismo põe a tónica na “liberdade de escolha e na responsabilização dos indivíduos”, argumenta o docente. “Cada um de nós tem a liberdade  de escolher o que quer e ser responsável pelas escolhas que faz, respeitando sempre o próximo. Não temos de ter um Estado a dizer o que queremos para a nossa vida” , reitera a membro fundadora da Iniciativa Liberal.

Contudo, o Estado deve assumir um papel “importante” na fiscalização e regulação da concorrência, essa que é outra das bandeiras do liberalismo. De acordo com a coordenadora do núcleo de Braga, “o Estado tem de existir e tem de ser um árbitro. Agora não pode ser jogador e árbitro, que é isso que acontece”.

Impacto das políticas liberais em Portugal

Segundo o partido, a instituição estatal tem também a responsabilidade de “dar ferramentas” às pessoas com dificuldades socioeconómicas, para que consigam ser autónomas e “fazer algo em prol de si e da sociedade”. É o que esclarece Olga Batista, que aponta a “literacia” como a principal ferramenta. Bruno Machado, membro da mesa do núcleo de Braga da IL e deputado municipal eleito nas últimas eleições autárquicas, reafirma esta posição ao considerar que “o Estado deve ajudar as pessoas, mas esta não pode ser uma ajuda infinita”.

Neste sentido, a coordenadora admite ser a favor do subsídio de desemprego, mas desaprova o facto de este ser um apoio recorrente, afirmando que “o Estado não pode alimentar constantemente essas situações”. O mesmo se aplica ao apoio à habitação, como exemplifica o deputado municipal. “Nós entendemos que esta ajuda deve ser dada no momento em que a pessoa precisa e que, ultrapassado esse momento, deve sair e procurar uma casa própria para que esse espaço possa ser cedido a outra pessoa que realmente precise”, argumenta Bruno Machado.

A IL defende também o fim do Salário Mínimo Nacional e a criação de um salário mínimo municipal, ou seja, definido por cada município. Dando o exemplo das regiões autónomas dos Açores e da Madeira, que têm salários mínimos mais elevados do que Portugal Continental, Bruno Machado justifica que este novo paradigma “iria gerar concorrência entre os municípios”. Consequentemente, uma maior competitividade poderia trazer, na sua perspetiva, “mais indústria, emprego e dinamismo económico”. “Ao haver dinamismo, naturalmente o salário mínimo iria aumentar, porque as coisas acabam por estar interligadas”, remata a coordenadora.

Já o docente da UMinho afirma que é preciso avaliar a situação com “cuidado”, visto que introduzir esta lógica de mercado “num país com graves assimetrias pode não resultar”. Apesar de concordar que é “uma solução muito bem pensada” para países com “uma economia mais igualitária em termos territoriais”, Miguel Rodrigues ressalta que a desigualdade regional de Portugal iria exigir a aplicação de mecanismos de correção “tão grandes que quase anulariam a lógica de competição e concorrência”.

Olga Batista, por sua vez, reconhece que a realidade portuguesa é diferente da situação de outros países mais competitivos, mas “não o tem de ser amanhã”. Assim, acredita que a solução passa por “olhar para os melhores exemplos” e “começar a trabalhar por algum lado”. “Não podemos pegar nestas políticas e aplicá-las diretamente, mas podemos começar a trabalhar para chegar aí”, conclui.