No arranque de mais um ano letivo, quase 50 mil jovens foram colocados na primeira fase do Concurso Nacional de Acesso ao Ensino Superior, o segundo maior número desde 1989. Com o êxtase da entrada na vida “quase” adulta surge também a corrida ao alojamento, que ano após ano se torna mais difícil. Não só há menos quartos para arrendar aos estudantes, como os preços estão cada vez mais elevados.

Um relatório divulgado pelo Observatório do Alojamento Estudantil (atualizado a 2 de setembro) aponta para uma redução drástica de 80% dos quartos privados disponíveis em relação a anos anteriores. Para o ano letivo 2022/23, há 1973 quartos para arrendamento com um preço médio de 294 euros, 10% mais elevado face ao ano passado.

Às dificuldades crescentes no mercado privado, juntam-se os problemas de oferta no setor público. Com a dificuldade em arranjar quarto espera-se uma maior ajuda por parte do Estado. No entanto, ficamo-nos pelas promessas.

Em julho, anunciou-se a construção de novas residências universitárias, financiadas pelo Plano Nacional para o Alojamento no Ensino Superior (PNAES). Com um investimento de 375 milhões de euros, “o maior investimento de sempre em alojamento estudantil”, o programa pretendia aumentar em quase 12 mil o número de camas. Dias depois, foram reprovadas metade das propostas apresentadas.

Adia-se assim, desde 2018, a ajuda aos universitários. No último ano, foram criados menos de uma centena de novos lugares em residências públicas. Atualmente, existem cerca de 15 mil camas, menos de 15% do número atual de estudantes deslocados.

Sobrelotados, caros e sem condições. Esta é a realidade dos (poucos) quartos hoje disponíveis para os estudantes. A maior parte das habitações, com alguma qualidade, estão apenas disponíveis para alojamento local ou para arrendar ao recente fenómeno, os chamados “nómadas digitais”. É assim que os senhorios fazem mais dinheiro, enquanto os estudantes se sujeitam a situações (muitas vezes) deploráveis.

É através de empréstimos, bolsas e ajudas da família que os alunos vão tentando contornar as dificuldades. E que, por vezes, não é suficiente. Desde testemunhos de estudantes que vivem em dispensas, dos que pagam 400 euros por um quarto (mais despesas) até aos que têm de desistir da primeira opção, pois não conseguem sustentar os custos do alojamento. Sinceramente, é preciso repensar a forma como Portugal dispõe dos seus recursos para garantir o básico para a formação dos seus jovens. Algo que, por muitas vezes, já foi anunciado como uma “prioridade”.

De nada serve aumentar o número de vagas quando não são acauteladas as condições necessárias para os estudantes. E de nada serve comemorar o segundo maior número de colocados no ensino superior quando grande parte tiver de sair por não conseguir pagar as contas. O abandono dos universitários vai ser uma realidade. Estamos a caminho de um ensino superior que não é para todos, cada vez mais elitista e apenas acessível aos que podem suportar os custos.