Daniel Caesar trouxe um novo álbum, Never Enough, e fez questão de relembrar aos fãs que o romance e as baladas de desgosto permanecem o seu forte. Lançado a sete de abril, este é um projeto claramente experimental que traz um toque de R&B à personalidade do artista. Never Enough mata as saudades daqueles que esperaram quatro anos pelo retorno de Caesar, mas não reflete o seu verdadeiro talento.

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Daniel Caesar fez um cover de “Street Lights” num dos seus primeiros EPs, Pilgrim’s Paradise, em 2015. Quando o gravou era ainda uma criança no mundo da música, com apenas 20 anos, mas a versão do artista (re-intitulada “Streetcar“) captou a angústia e o talento, que não coincidiam com a sua idade, e foi um sucesso. O artista deixou o electro-R&B para trás, porém, manteve uma conexão com o estilo emo, suportando a sua voz com pianos, baterias e guitarras. Lançou posteriormente, em 2017, Freudian e aumentou as expectativas de todos. No entanto, a música que se seguiu não foi tão bem conseguida e, já tendo referido que não queria replicar Freudian, Caesar traz este álbum experimental e comprova que ainda não encontrou o seu estilo perfeito.
Em Never Enough, o músico é extremamente diferente daquilo a que foi fiel ao longo destes anos, trazendo auto-tune, uma voz mais grave e versos aleatórios no campo do rap. A “Buyer’s Remorse” foi uma das piores surpresas do projeto, sendo que o auto-tune utilizado por Omar Apollo não oferece beleza e, apesar dos bons vocais de Daniel Caesar, a faixa não conseguiu ser salva. Já com “Shot My Baby“, um conto de infidelidade tornado em manslaughter, o artista conseguiu tornar o desvio da sua típica autoficção mais envolvente.
Muitas canções abrem com cerca de 20 segundos de música distorcida ou mais silenciada. Isto foi algo que ajudou com a “Ocho Rios”, um romance repleto de “toxicidade masculina”, que quase se torna angelical com a guitarra e a bateria a dar um perfeito toque de rock ao refrão. Foi definitivamente a “saving grace” do projeto. Em contrapartida, uma “toxicidade masculina” menos fascinante surge com Ty Dolla $ign em “Homiesexual”. Infelizmente, Caesar escolheu features com homens e isso talvez tenha sido o seu pior erro. Ainda que para muitos o rap tenha uma contribuição positiva nesta faixa, Ty Dolla $ign refere, “i’m not perfect”, e isso confirma-se.
Mustafa escapa à retórica das features masculinas, foi dos poucos pontos acertados do álbum. “Toronto 2014” traz uma romantização e nostalgia da vida antes do dinheiro e da fama, relembrando “back to when i was happy being me”. É uma letra que já ouvimos uma, duas e três vezes com outros artistas, mas as vozes de Caesar e Mustafa tornam o básico fascinante e harmonioso. É de realçar ainda a perfeição das faixas “Let Me Go” e “Always”, com diferenças entre si, mas uma semelhança conectada ao estilo de balada. “Always” surge como música bónus acompanhada de Summer Walk, a única voz feminina que comprova que deveria ter sido esta a direção do artista.
Como sempre, a plataforma do TikTok tem um papel estranhamente forte na divulgação e popularização de canções e a “Please Do Not Lean” não foi exceção. Foram mais de 38 milhões de pessoas a render-se aos últimos versos (“If I am the sky, you are the sea / Starin’ back at me”) repletos de vocais sobrepostos pela voz calma e extraordinária de Caesar. É importante fazer uma menção honorária a uma faixa menos reconhecida, “Pain Is Inevitable”, com apenas três milhões de reproduções. O músico defende “now I’m a product, that must turn a profit” e aborda subtilmente os problemas da indústria, acrescentando um instrumental que parece retirado de uma orquestra de ópera, uma faixa verdadeiramente agradável de início ao fim.
Quando não intelectualiza demasiado as suas emoções, Daniel Caesar consegue ser desarmante e cru. Infelizmente, a direção incerta e alguns pontos menos favoráveis deste álbum afastam-no da total satisfação. Ainda assim, este vislumbre do artista renascido não deixa de fazer com que “Never Enough” seja uma recompensa gratificante para os fãs fiéis e uma introdução digna para novos ouvintes. O álbum pode não ser inovador do ponto de vista sonoro ou lírico, mas Caesar manipula os seus talentos para salvar um trabalho delicadamente familiar e, ao mesmo tempo, experimental. É algo que alimenta a excitação dos fãs para o futuro da sua arte.
Álbum: Never Enough
Artista: Daniel Caesar
Editora: Republic
Data de Lançamento: 7 de abril de 2023