Lançada em 2021, pela maior emissora tailandesa no campo do entretenimento e ficção, NOT ME é um retrato de diversas questões da Tailândia. Rapidamente se tornou a série que mais se destoa comparada com as outras do país.

A narrativa começa quando Black é brutalmente espancado e fica em coma no hospital. Black é um de dois gémeos, que foram separados durante a infância depois de partilharem um laço inquebrável por 6 anos. Enquanto que o protagonista vive com a mãe na Tailândia, o seu irmão , regressa da Rússia com o pai. Acaba por descobrir o acidente do irmão através de um amigo de infância em comum, o Tod. Decide então, infiltrar-se no gang do irmão fazendo-se passar por ele, numa tentativa de descobrir quem o magoou. Os integrantes do gang são: Sean, Yok, Gram, Gumpa e Black.

O Black e o White são totalmente diferentes. Ambos interpretados pelo renomado ator Gun Attaphan mostram-se ser totais opostos. O Black é destemido, conflituoso, imprevisível e extremamente teimoso. Faz parte de um gang com outros que procuram justiça perante as gritantes desigualdades do país. White por sua vez é delicado, sensível e frágil. Segue uma conduta limpa e exemplar e procura seguir, assim como o pai, uma carreira de sucesso na política.

A série desenvolve uma narrativa muito única e própria que culmina numa série de críticas sociais extremamente importantes. A primeira critica é a discriminação LGBTQIA+ pois a Tailândia é um país ainda conservador, que não legalizou o casamento homossexual e que ignora politicamente a questão LGBT. Além de representar um romance belo e cativante entre o Sean e o White, deu palco a ativistas reais da questão, escolhidos pela diretora da série P’Nunchy. Uma das cenas mais emblemáticas é uma cena de protesto à LGBTQIA+ fobia. Serviu de apoio à comunidade em que diferentes pessoas queer desfilam e lutam pelos seus direitos, com o levantar da bandeira representativa numa cena extremamente tocante.

Por outro lado, a corrupção, o abuso de poder, e as acentuadas desigualdades sociais do país são fortemente exploradas na série. Essa dinâmica é extremamente evidente na relação entre o Sean e o White. O Sean cresceu numa família pobre, logo desde cedo percebeu que a vida não começa da mesma forma para todos. White sempre foi privilegiado, e até ao momento em que se fingiu passar pelo irmão não tinha consciência desse privilégio. É através do gang, das suas histórias, e especialmente dos diálogos com Sean que este começa a ponderar a realidade que sempre conheceu. Percebe como é fácil ser manipulado numa narrativa romantizada e privilegiada da vida.

A personagem do Tawi, dono de uma manufatura e envolvido em tráfico de droga é uma representação da corrupção e dos privilégios dos ricos. É uma personagem central da trama que cria e levanta diversas questões éticas relativas ao sistema judicial tailandês.

O abuso de poder policial é desenvolvido na narrativa do Dan, um polícia que se envolve com Yok. Dan não concorda com muitos dos aspetos em que é inserido, mas não tem escolha senão obedecer cegamente às ordens que lhe dão. Apesar disso, este reconhece que existem várias questões problemáticas e corruptas na força policial e nas políticas do país. É através da arte que ele assume uma nova identidade: UNAR, onde consegue expressar aquilo que sente e pensa verdadeiramente. É a arte que une Dan e Yok. Apesar de serem um casal secundário com cenas bastante espaçadas, a emoção que carregam, o simbolismo e a importância não se esvanecem.

Yok revela-se ser alguém que procura lutar por um mundo muito mais inclusivo e aberto, especialmente pela mãe sofrer por ser muda. Yok junta-se ao gang como uma forma de abrir espaço para que pessoas com qualquer tipo de deficiência consigam expressar-se e serem ouvidas.

Com um dos elencos mais avultados a nível de qualidade na Tailândia revela-se ser uma entrega maravilhosa em todos os sentidos: atuação, narrativa, cinematografia e trilha sonora. A cinematografia é dos pontos mais altos da série. Com as contratantes cores frias e quentes de acordo com a emoção a ser transmitida,. Os diferentes ângulos e perspetivas exploradas e a liberdade de trazer algo verdadeiramente diferente, NOT ME é um paraíso visual. A trilha sonora é maravilhosa com diferentes géneros musicais escolhidos pela diretora.

A série foi dirigida pela P’Nunchy, uma mulher que compreende perfeitamente as questões que realmente importam serem discutidas. Ao trazer luz e voz a assuntos tão sensíveis de uma forma tão inteligente sem descurar o interesse da narrativa e o tom mais ficcional. NOT ME mostra ser uma série à frente do seu tempo.