O abandono pinta cada vez mais a terceira idade, que acumula sinais de depressão e ansiedade.
Reconhecido pela Organização Mundial da Saúde (OMS), o Dia Mundial da Saúde Mental é celebrado a 10 de outubro desde 1992 para destacar os vários problemas que podem afetar as diferentes fases da vida, incluindo a camada mais velha. Em Portugal, a Coordenação Nacional das Políticas de Saúde Mental (CNPSM) promove a data com o tema “A Saúde Mental é um Direito Universal”, a partir de uma sessão comemorativa.
A conferência vai decorrer na Fundação Calouste Gulbenkian, com a presença de autoridades como o ministro da Saúde, Manuel Pizarro, o coordenador nacional das políticas de saúde mental, Miguel Xavier e a secretária de Estado da Promoção da Saúde, Margarida Tavares. O evento vai contar com uma mesa redonda e a assinatura de um protocolo entre o Ministério da Saúde e a Fundação Gulbenkian, com a presença de investigadores da área da saúde.
A saúde mental na sociedade portuguesa
A discussão dos desafios na luta pelo bem-estar psicológico dá principal visibilidade aos problemas enfrentados pela juventude. Os desafios da terceira idade passam assim despercebidos e torna-se necessário dar uma maior importância aos indivíduos que se encontram nessa fase da vida.
“Portugal apresenta, atualmente, cerca de dois milhões de pessoas com mais de 65 anos, sendo o 43º país com o maior número de idosos na sua população total”, apontam as pesquisas da Organização das Nações Unidas (ONU). O país ocupa ainda “a 5.ª posição entre as nações com mais casos de depressão no universo da União Europeia”, de acordo com o Diário de Notícias. A doença afeta cerca de 10% da população mais velha em Portugal, facto que agrava fortemente os problemas relacionados com a saúde mental dessa faixa etária.
Como é que a saúde mental afeta os idosos?
Os idosos são preparados para um envelhecimento físico saudável, deixando a questão mental em segundo plano. Nessa fase da vida, observam-se inúmeras mudanças nas pessoas, tanto a nível físico, com uma diminuição da visão ou alterações de peso, como a nível psicológico, com falhas na memória e dificuldades de raciocínio. Assim, os indivíduos que apresentam transtornos mentais ao longo da vida, ainda que sejam leves, observam um agravamento de certas doenças ao longo dos anos.
Segundo O Público, o “crescimento do fenómeno do idadismo, uma forma de discriminação com base na idade”, é uma das principais razões pelas quais os idosos são “abandonados à margem da sociedade”. Alguns chegam a ser abandonados “pelos seus próprios familiares, que os consideram como um fardo”. Estes problemas exigem muitos cuidados, apoio e atenção durante a fase do envelhecimento.
Os transtornos mentais mais comuns na terceira idade são “a depressão, a ansiedade e diferentes formas de demência”, doenças que influenciam a qualidade de vida dos mais velhos, referiu o médico Alexandre Mendes ao Observador.
A saúde mental nos lares da terceira idade
Em entrevista ao ComUM, a diretora técnica do Asilo de São José, Irmã Maria Luísa, comentou a dificuldade que os idosos residentes em lares de repouso têm ao lidar com a sua saúde mental. No Asilo de São José há pessoas que “vivem como se não vivessem”, apresentando tantas limitações que “atingem a sua própria consciência de vida”, menciona a Irmã. Dessa maneira, idosos apresentam doenças mentais “como Alzheimer” e podem não “ter a perceção de como realmente estão”, algo que dificulta a avaliação da saúde mental nesses indivíduos.
A responsável destaca que a questão da saúde mental nos lares pode afetar também “os funcionários, os cuidadores do asilo e os próprios familiares que visitam”. Estas são pessoas que, normalmente, conheceram o idoso “nas suas faculdades plenas” e, agora, observam-no com “limitações e dificuldade de compreensão”. “É sempre um choque” para as famílias que vão ao asilo, o que cria um certo “constrangimento para quem cuida” e para quem vivenciou momentos do “auge da vida” do residente.
É possível observar idosos que lidam com a depressão, motivada por “uma nostalgia”. “Há utentes que vêm para o Asilo de São José e trazem consigo uma boneca” ou “objetos de afeição”, como uma “forma de se relacionarem” e “confortam-se a partir deles”, afirma a Irmã Maria Luísa. Os principais sinais depressivos nos mais velhos, no Asilo de São José, observam-se “através das atividades de integração”, uma vez que os idosos tendem a “isolar-se” de todo o grupo. Os cuidados com esses utentes são sempre reforçados para “puxá-los para o grupo”, com todo o respeito e cautela, pois geralmente são atividades que os retiram de sua zona de conforto.
Um dos grandes problemas apontados pela entrevistada é a falta de lares especializados na saúde mental, algo que poderia ganhar mais atenção por parte dos órgãos governamentais. Os lares estão “mais ou menos adaptados a nível governamental e de segurança social”, exigindo “estruturas mais adequadas para essas situações”. A Irmã propõe, ainda, soluções para facilitarem o cuidado. Entre elas o desenvolvimento de “salas mais específicas para determinadas atividades” e “maiores ajudas financeiras para a contratação de técnicos especializados” na área da saúde mental, com o objetivo de lidar melhor com os utentes fragilizados.
A diretora técnica relembra que “cada caso é individual” e os lares geriátricos apresentam “uma variedade muito grande de situações”. Ainda assim, reforça a importância dos cuidados que “sempre devem ser prestados pelos asilos”, como “orientações de higiene, de alimentação e de hidratação”, auxílios que podem promover um melhor bem-estar mental e físico dos mais velhos.
O Dia Mundial da Saúde Mental é de extrema importância para promover uma maior compreensão da luta pelo bem-estar psicológico em todas as fases da vida. É imprescindível que a sociedade dê uma maior atenção e visibilidade aos mais velhos, de modo a atenuar as suas dificuldades. Assim, será possível garantir o direito universal da saúde mental, para que todos possam usufruir de um maior respeito, dignidade e melhores condições de vida em diferentes faixas etárias.