A produção americana O Sentido do Amor estreou ao décimo dia de outubro de 2011. Como o próprio nome (em inglês: Perfect Sense) indica, o filme leva os espectadores numa viagem intensa pelos sentidos, repleto de altos e baixos.
A trama desenvolve-se à volta da emergência de uma epidemia que se propaga à escala global. Eva Green dá vida a Susan, uma epidemiologista. A médica conhece, entre todo o caos epidémico, Michael, um cozinheiro com quem sente uma conexão quase instantânea. A relação de ambos só tende a crescer e fortalecer-se até ao pico e pior estado da epidemia. Juntamente com a sua equipa, Susan procura incessantemente perceber a origem do surto capaz de privar os seres humanos dos seus sentidos de forma progressiva.
É de todo o caos epidémico que podemos retirar o primeiro destaque da produção. É uma abordagem interessante e um espelho de uma grande análise do que é o comportamento humano em questões de vida ou morte. No filme, a cada sentido que a população perde na consequência da doença desconhecida, segue-se uma onda de fúria, que faz com que os cidadãos se revoltem uns contra os outros.
Recuperemos a data de lançamento – 2011 – para então percebermos e estabelecermos a comparação com o que vimos acontecer em 2020, na vida real, com o surgimento da pandemia do Covid-19. Quem vir o filme de forma atenta e com um olhar especialmente crítico, vai perceber que as semelhanças são muito subtis, mas, efetivamente, estão lá.
A crítica social de Kim Fupz Aakeson, argumentista, é evidente. O ser humano é um ser que sente e tem a necessidade de conscientizar-se desse sentimento. Parece complicado, mas o filme é um perfeito espelho desta abordagem tão humana. Por exemplo: graças à contaminação, as pessoas ficam privadas do paladar. Consequentemente, passam a alimentar-se do essencial à sobrevivência, e contentam-se com as texturas da comida ou o simples tilintar de pratos e talheres.
A forma como a temperatura de cor é usada é interessante e, vindo de uma produção com uma década, é de notar que, em termos técnicos, não houve uma grande mudança na cinematográfica. Em O Sentido do Amor, a temperatura é maioritariamente fria – transparecendo toda a solidão e tristeza epidémicas. Já na reta final, a cor parece aquecer com a aproximação da – aparente – resolução da tragédia.
Ainda numa parte mais técnica, uma menção importante aos ângulos e posições de câmara: há exemplos estranhos e, segundo um ponto de vista bastante pessoal, até mesmo cómicos. Numa parte inicial a câmara está presa à bicicleta da personagem principal masculina, Michael. Percebe-se qual o objetivo (no caso, dar a entender a confusão do cozinheiro ao ver todos a usar máscaras), mas não deixa de parecer pouco agradável esteticamente.
É por coisas como esta que toda a produção perde pontos. Todo o filme parece um emaranhado confuso. De tão confuso que é, parece proposital e, se assim for, isso torna-se – minimamente – justificável. Mas acaba também por se perder demasiado em técnicas e abordagens estranhas que acabam por tirar sentido à história.
A acrescentar aos pontos menos positivos está a representação exagerada em certas alturas do enredo. Esse aspeto acaba por ridicularizar o romance, que cresce com o avançar da trama.
O mais relevante deste trabalho resume-se, portanto, e sem margem para dúvidas, à forma como os sentidos de quem vê o filme também são postos à prova. Quando uma das personagens principais perde a audição, o espectador também é privado de ouvir e, quando é a visão que se perde, fica tudo escuro.
Para além do envolvimento do espectador na história – e em forma de conclusão desta crítica – importa destacar outro aspeto da longa-metragem. A sociedade em O Sentido do Amor é desenhada detalhadamente, envolta num caos e incerteza credíveis e impactantes.
Além disso, é de importância maior de recapitular as (diversas) falhas que fazem com que a produção deixe muito a desejar. Com planos fora de contexto e esteticamente pouco agradáveis ao elenco que exageram as emoções e situações, o filme culmina numa confusão que pode, ou não, ser proposital.
Título original: Perfect Sense
Realização: David Mackenzie
Argumento: Kim Fupz Aakeson
Elenco: Eva Green, Ewan McGregor
Estados Unidos da América
2011