A Capela Imaculada de Braga encheu-se de curiosos no passado sábado, 4 de novembro. O Festival Literário Utopia acolheu diversas atividades, desde do humor à ditadura.
O território do humor
Foi sobre O território do humor que Bruno Nogueira e Filipe Melo vieram conversar, com moderação de Hélder Gomes. Os intervenientes refletiram sobre o politicamente correto e aquilo que está e continua a estar ao abrigo da comédia em 2023, com toda a cultura do cancelamento que parece pouca em Portugal.
O humorista e o músico discutiram pequenos momentos das suas carreiras relativamente ao humor, assim como as perspectivas perante o tema, sem qualquer medo. Para Bruno Nogueira, em especial, parece-lhe não existir diferença significativa em relação a filtros humorísticos na atualidade, mas sim a quem vive ao abrigo do “agora não se pode dizer nada” como desculpa.
Mencionou-se também o espetáculo Uma Nêspera no Cu, onde ambos os artistas participam e que é fruto de algo criado há quase 10 anos, refletindo precisamente a ideia de que a atualidade não requer uma exigência acrescida perante a construção de bom humor.
Após o evento moderado por Hélder Gomes, o ComUM entrevistou Bruno Nogueira e Filipe Melo. Os convidados do quarto dia do Festival Literário Utopia falam, de forma mais sucinta, sobre o tema em questão- e tudo aquilo lhes apetecesse dizer.
O que a chama iluminou
Na sessão da noite, O que a chama iluminou foi o espetáculo apresentado na Capela Imaculada, em Braga. Criada por Afonso Cruz a peça une e combina três das suas grandes paixões: a escrita, a música e a fotografia. O espetáculo fica ainda mais rico com a presença da artista Mariana Ramos Correia que aqueceu a sala com o seu violoncelo e pontuou o texto narrado, como se fosse um eco.
Uma história cantada, tocada e contada na primeira pessoa, leva-nos até ao Chile. A música, a performance, a fotografia e a narração transportam-nos para o país latino, numa época com muita agitação política. O que a chama iluminou carrega as marcas deixadas pelas lascas da ditadura de Pinochet.
“Mudar de país na América Latina, é como mudar de camarote no Titanic”, é uma citação muitas vezes repetida durante todo o espetáculo, de forma a salientar ainda mais ao público a instabilidade vivida no local que deu cenário à narrativa- o Chile. São as vivências vividas pelo narrador, que também é a personagem principal, que dão vida à história.
Aborda-se o “fim do mundo”. Portugal já foi, outrora, o fim do mundo europeu, e hoje, para muitos, o Chile também o é. Foi na sua viagem ao “fim do mundo”, mais concretamente à Patagónia, que Afonso Cruz sofreu um acidente que lhe poderia ter tirado a vida. Numa das fotografias apresentadas, mostra as feridas na cara e que persistiram ao tempo.
Afonso Cruz toca ainda em temas transversais, como a perda e a ausência, focando-se nomeadamente na extinção de línguas e de povos, de mortes que ocorreram no Chile e da desumanização. “Somos a única espécie que pode desumanizar. (…) Um humano pode desumanizar outro ou ser desumanizado. E, alguns, vivem para um destes botões.”
Artigo escrito por: Mariana Dias e Jéssica Machado