As artes cénicas continuam a viver pela voz e gestos dos amantes do palco e da dramatização.
O teatro português é um mar pouco navegado no seio da cultura portuguesa. Com a crescente valorização de outros meios de entretenimento como o cinema e pela preferência no consumo de peças audiovisuais, desenvolvidas com base nos meios digitais, o teatro é por vezes esquecido ou desvalorizado, especialmente pela geração mais jovem.
Em entrevista ao ComUM, Felipe Rocha, Maria Vicente e Maria Moura, profissionais de teatro amador contam como o teatro pode ser transformador na vida quotidiana. Felipe Rocha começa por explicar que a sua experiência no teatro começou de forma informal, aos 19 anos, no Brasil, num grupo de jovens. Para Felipe, teatro é “uma forma cultural de expressão, de eventos, acontecimentos ou mesmo da imaginação de alguém. É um script personalizável da história de alguém”.
Maria Vicente, atriz da academia de teatro Tin.Bra, partilha que a sua vontade de começar no teatro surgiu sobretudo da dramatização informal com amigos porque não se “sentia julgada”. A entrevistada afirma ainda que o “teatro é uma paixão e uma ferramenta para expressar e para a mudança”.
Para Maria Moura, atriz da mesma academia, “teatro sempre foi aquilo que eu quis experimentar”. A razão passa por viver e experienciar sentimentos, de “forma aberta sem termos medo”, “experimentarmos ser aquela personagem e viver a vida daquela pessoa que não é como nós”, completa.
A ideia de Felipe vai ao encontro da de Maria Moura. Para o ator, o melhor do teatro é “num determinado momento, poder “ser” outra pessoa que não tem nada a ver connosco, mas que é interessante a título de experiência”. Felipe sublinha que os seus papeis eram quase sempre de coadjuvantes, mas isso não o impediu de experienciar a beleza do teatro.
Maria Vicente mostra preferência pela parte de encenação e desenvolvimento de figurinos. Conta, no entanto, que com a mudança de colaboradores na sua companhia de teatro, as peças optam agora por designs mais simples, e aflorou a sua paixão pelas cenas de improviso.
O teatro é normalmente visto como uma forma de expressar e transmitir cultura e valores. Felipe comenta que o “teatro é, por si só, um empreendimento cultural, representa uma cultura. A história do teatro, e a sua evolução, são cultura. Agora o que se traz a nível de conteúdo no teatro pode ser ou não ser cultural”.
O aspeto cultural é extremamente importante para o contexto do teatro e também para sua possível valorização ou desvalorização em determinados países. Na maioria das vezes associa-se o teatro português a uma crescente desvalorização. Felipe, que já viveu em realidade diferentes, no Brasil e na Irlanda, com uma maior valorização do teatro, associa essa questão a fatores como a falta de disseminação do teatro que existe no país comparado aos cartazes de cinema, por exemplo. Por outro lado, o preço do teatro é algo que o entrevistado também realça como um fator de desinteresse, por ter altos custos associados.
Para Maria Moura a desvalorização advém da falta de estímulo ao consumo e a apreciar artes cénicas em Portugal. “Quando eu ia ao teatro era com a escola, quando parei de ter visitas de estudo parei de ver teatro”. Explica que as poucas vezes que foi ao teatro depois dessas visitas de estudo, antes de integrar a Tin.Bra, eram para assistir aos amigos que já integravam a academia e acrescenta que a preferência dos amigos é por assistir a filmes ou outras atividades.
Para uma crescente aposta e valorização do teatro português Maria Vicente sugere colocarem teatro no currículo das escolas assim como fazem com a música, isto porque “a maioria das pessoas só têm uma perspectiva do que é o teatro, como espectador, e não como alguém que já experimentou e isso pode transmitir-lhes uma ideia errada sobre o que é o teatro”.
Os atores não deixam de fazer um convite para experimentar e assistir a teatro no intuito de conhecer mais sobre este mundo que pode ser uma caixinha de surpresas. Felipe deixa a mensagem às gerações mais novas para que se “divirtam com teatro, aproveitem teatro, vendo-o como uma ferramenta de entretenimento, e se tiverem oportunidade de fazer teatro aproveitem para expressar os seus sentimentos, despindo-se dos seus próprios conceitos e vestindo outros”.