A realizadora de Shiva Baby, Emma Seligman, volta às nossas telas com mais um coming of age fantástico, posicionando-se no panorama cinematográfico como uma das realizadoras em ascensão mais promissoras. Em Bottoms, Seligman convida-nos a debruçar, mais uma vez, sobre um mundo caótico e satírico, acompanhado de personagens problemáticas que nos fazem apaixonar e torcer por elas.
Josie e PJ, duas adolescentes com fracas habilidades sociais, criam um fight club feminino na escola secundária que frequentam para conseguirem conquistar as cheerleaders por quem têm uma queda. Soa ridículo? Certamente. No entanto, é através do ridículo que o filme triunfa. Bottoms humoriza através de um tom surrealista e punchlines absurdas, criando uma peça original e curada para a geração Z. Notórias são as influências, nomeadamente Superbad (2007), que apesar de presentes, apenas dão as bases para esta nova longa. Seligman pega naquilo que adoramos sobre as comédias dos anos 2000 e usa essas ferramentas para criar uma comédia adequada ao cenário de 2023 e com um carácter próprio.
O coração deste filme está nas atuações de Ayo Edebiri (Josie) e Rachel Sennott (PJ). O par adorado pela internet contracena pela primeira vez e brilha com as suas performances cómicas, capazes de satirizar as personagens que representam, sem cair na caricatura. Entregam as falas humorísticas com o timing perfeito, demonstrando proficiência na ala da comédia, ao mesmo passo que são capazes de dramatizar e dar profundidade a Josie e PJ nos momentos em que o filme pede seriedade. Estas duas personagens funcionam perfeitamente como duo. Equilibram o tom do filme com a personalidade mais imprudente e confiante de PJ com a gentil e cautelosa de Josie. Juntas criam uma dinâmica divertida ao ponto de cair a rir.
Para pintar o resto da cena, o filme dispõe de um essemble fantástico e de várias outras personagens cómicas. O antagonista Jeff, o jogador de futebol preferido da equipa escolar, podia facilmente ter caído num arquétipo aborrecido. No entanto, o 2filme apresenta uma nova versão do adolescente idolatrado com masculinidade frágil. Bottoms ridiculariza esta trope e faz de Jeff uma das personagens mais engraçadas do filme. Quebra-se por completo a casca deste tipo de personagens e faz-se de Jeff quase um bebé chorão na forma de um adolescente de dezoito anos. Da mesma maneira que aplaudo o roteiro, aplaudo Nicholas Galitzine pela sua atuação, pois muito que adoramos sobre o Jeff é do mérito do ator e da sua brilhante performance. O elogio estende-se ao resto do elenco, nomeadamente Ruby Cruz, Havana Liu e Marshawn Lynch.
Ressalto também a seleção da música para a trilha sonora, pois com três needle drops é capaz de encapsular perfeitamente o espírito deste longa. Bottoms utiliza duas músicas mais antigas, mas que estamos familiarizados culturalmente, para ironizar duas cenas outrora dramáticas demais, mantendo assim um tom satírico. Complicated de Avril Lavigne e Total Eclipse of the Heart de Bonnie Tyler são utilizadas, não meramente como barulho de fundo, mas sim como mais um elemento cómico do filme, dando forma ao estilo único do mesmo. A terceira escolha a que dou ênfase é a party4u de Charli XCX que desfecha esta longa com uma faixa moderna e que encaixa na estética gen Z. Desta forma, o filme faz chamadas aos grandes e influentes do passado sem depender meramente dos sucessos deles para conseguir entreter.
Se está com saudades de ver uma boa comédia não percas mais tempo e assiste Bottoms! A nova produção de Emma Seligman prova que este género cinemático não está morto, mas apenas em busca de novas vozes.
Realizadora: Emma Seligman
Argumento: Emma Seligman e Rachel Sennott
Elenco: Ayo Edebiri, Rachel Sennott, Nicholas Galitzine, Ruby Cruz, Havana Liu e Marshawn Lynch
Estados Unidos da América
2023