Há quem, numa ida ao cinema, se esqueça de colocar na equação a opção de ver uma obra portuguesa. Há algo que, à primeira vista, não as torna tão apetecíveis. Talvez porque não haja tanto burburinho à volta das mesmas, quando comparados aos filmes estrangeiros. Talvez pela necessidade de apostar num filme que, à partida, se saiba que vai ser bom. Talvez pelo receio de uma desilusão, pelo medo de perder uma boa noite de cinema.
É tudo um “talvez”, uma aposta acertada, o medo de arriscar. Mas porque não? Porque não assistir a um filme não tão apetecível? Porque não arriscar? Procurar algo novo, estimulante? Porque não? E quiçá descobrir um tesouro, um tesouro bem guardado.
É certo que o cinema português não é perfeito, mas nenhum o é. Há sempre falhas a apontar, detalhes a aprimorar, mas acima de tudo há sempre pormenores a enaltecer. Primeiro, porque as longas metragens portuguesas contém uma especificidade: a capacidade de refletir a autenticidade cultural.
As longas metragens nacionais refletem com mestria a identidade de um povo. Descobrem-lhe as manias, as ousadias, os hábitos. Por exemplo, o filme “A Gaiola Dourada” faz transparecer, apesar de se passar em França, a essência do povo lusitano. Há um acentuar de sotaques, um intensificar de gestos, há a necessidade de ter um pouco do que é Portugal refletido na fala, nos costumes. Há um retrato de uma família portuguesa que se aproxima daquela que está no sofá a assistir.
Também “Poor Things” tentou roubar um pouco da identidade lusitana, ao “apropriar-se” do pastel de nata, ou até mesmo das melodias saudosas do fado. Portugal tem muito de cativante na sua forma pura de agir e a sétima arte usa isso a seu favor. A produção cinematográfica portuguesa utiliza a proximidade, relatando relações humanas e contextos locais, de modo a proporcionar uma experiência mais íntima para o espectador.
No fundo, o cinema português tem ainda a vantagem de se ver instalado num terreno muito fértil a nível histórico-cultural. Filmes como “O Ano da Morte de Ricardo Reis” ou até “Soldado Milhões” ganham outra força, por estarem envoltos de uma riqueza e importância histórica extrema.
Da mesma forma, por retratar contextos tão próximos dos do espectador é capaz de gerar muito impacto emocional. O filme “Os gatos não têm vertigens” para além de retratar a solidão na velhice, retrata também as relações intergeracionais, algo que se relaciona diretamente com Portugal, pois é um país extremamente envelhecido.
A verdade é que as obras cinematográficas portuguesas são reconhecidas a nível internacional. Mas será que os portugueses as reconhecem? Filmes como: “O Ornitólogo”; “Mistérios de Lisboa” e “Tabu” são apenas alguns dos filmes que foram alvo de reconhecimento em festivais internacionais de cinema. Terão sido alvo de reconhecimento também pelos portugueses?
É claro que nem tudo joga a favor do cinema português. As limitações orçamentais, a menor visibilidade internacional e a barreira linguística prejudicam o alcance das produções nacionais. No entanto, há necessidade de não o deixar morrer.
É necessário lembrar filmes icónicos como “7 pecados rurais”, “O Pátio das Cantigas”, “A Canção de Lisboa”, para reforçar a vontade de consumir produções cinematográficas nacionais. É necessário relembrar o que de tão bom tem o nosso país, o bom cinema que se faz, as boas histórias que inundam as terras portuguesas, a qualidade que emana dos projetos realizados. É urgente valorizar o cinema, consumir cinema e, de preferência, português.