Tendo em conta que em março FLETCHER lançou o seu mais recente projeto, In Search Of The Antidote, parece ser boa altura para voltar a ouvir Girl Of My Dreams, o álbum de estreia da artista.

Cari Elise Fletcher, mais conhecida apenas pelo sobrenome, já tinha mostrado aquilo que valia nos seus três primeiros EPs. Mas com o álbum Girl Of My Dreams, a cantora solidificou as suas habilidades vocais e líricas e aproveitou para introduzir novos elementos ao seu estilo musical.

Rolling Stone

Mesmo com estas novidades, houve espaço para homenagens ao trabalho anteriormente feito. Logo no começo do álbum, em “Sting”, são feitas menções à canção “All Love” (2019) e ao EP THE S(EX) TAPES (2020). Se bem que, o melhor exemplo destas homenagens seja a segunda faixa, “Guess We Lied”, uma reinterpretação do single “If You’re Gonna Lie” (2019).

FLETCHER manteve uma das suas características mais fortes: não ter papas na língua. As letras brutalmente honestas da artista, rápidas de aprender de cor e salteado, estão aqui presentes. Por “brutalmente honestas” entendem-se quer letras com indiretas “demasiado diretas”, quanto letras sensíveis e fáceis de criar identificação com o público.

Ao falar-se sobre este álbum, uma das músicas que vêm imediatamente à mente é “Becky’s So Hot”. Este é um single com fortes inspirações no pop rock – um estilo fortemente presente no disco. No entanto, o destaque vai para a mensagem audaz e sem filtros. FLETCHER canta que não sabe se deve odiar ou não a atual namorada da ex, por achá-la muito sexy. Ora, isto pode ter várias interpretações! Becky’s So Hot é uma canção sobre ciúmes. Mas FLETCHER sente ciúmes dessa “Becky” por estar com a sua ex, ou será que ela, na verdade, tem ciúmes da ex por estar com a “Becky”? Esta ambiguidade pode ser chamada de “golpe de génio”.

E logo de seguida, tem-se a faixa número cinco, Better Version, uma das que tem a composição mais sentimental deste projeto. FLETCHER questiona se o seu antigo amor continua a pensar nela, sentindo pena por não ter visto a melhor versão dessa pessoa. No fim, ocorre uma reviravolta e a cantora lamenta que tenha sido o seu novo amor a conhecer o seu novo “eu”. O instrumental cria uma atmosfera íntima, quase melancólica, que encanta o ouvinte.

Em Girl Of My Dreams ocorre um bom número de momentos acústicos. E quando não se está a escutar guitarras clássicas, ouvem-se as elétricas numa produção meticulosa. Porém, aquilo que mais se destaca neste projeto é a sua narrativa linear. É retratado um tema que, por mais repetido que seja, mantém-se relevante. Tema este que aos poucos é revelado, enquanto se descobre quem é a miúda dos sonhos de FLETCHER. Mas, afinal, quem é ela?

A verdade é que este álbum é uma jornada na procura do amor próprio. A Girl Of My Dreams de FLETCHER é ela própria. Este projeto nunca foi inteiramente sobre algum antigo amor, ou sobre a ex com quem partilhava a data de aniversário, ou até sobre a “Becky”… Não! This one’s for Cari. Isto foi sempre sobre e pela Cari, tal como a última canção explicita. Existe um fosso a separar a FLETCHER, a performer, e a Cari, a pessoa. Este fosso diminui e a FLETCHER pode finalmente cantar para a Cari.

Ouvir este álbum e perceber qual é a verdadeira temática causa uma sensação peculiar. É quase como se as realizações descritas também estivessem a acontecer na mente do ouvinte. Lá no fundo, cada um pode ser o seu Romeu, mas também a sua Julieta; cada um pode ser “a rapariga dos seus sonhos” desejada ao soprar as velas do bolo de anos.

Ao longo de treze canções, FLETCHER relata alguns dos seus relacionamentos falhados e outras vivências que a levaram a este despertar interno. Ela transporta os ouvintes para uma odisseia de amadurecimento, para a descoberta da auto-suficiência. Pelo caminho, ouvem-se instrumentais, letras cativantes e de imensa sinceridade, com referências a outros projetos dela e, inclusive, a ídolos como Taylor Swift. A Cari tem todos os motivos para sentir orgulho.