Trap, o novo filme do infame M. Night Shyamalan, criou altas expectativas entre o público com um dos trailers mais excitantes do ano. Através de um conceito invulgar e uma incrível habilidade de criar suspense, cogitou curiosidade para este novo thriller psicológico. No entanto, a barreira que a longa metragem criou para si mesma não conseguiu ser ultrapassada. Acabou por desapontar o espectador e não fazer cumprir a promessa do trailer.
Após a visualização da peça, é evidente que a maneira como o filme foi promovido perturbou a forma como foi recebido. No trailer é-nos desvendado, imediatamente, que o concerto a que Cooper levou a sua filha adolescente, Riley, é uma armadilha para o apanhar. Já que, na verdade, o doce pai que proporciona à filha a alegria de assistir ao vivo a sua artista preferida, é um assassino em série. Esta revelação foi bem montada e criou intriga com êxito, prometendo um ousado seguimento da história. Todavia, a ocultação da revelação demonstra ser essencial, pois o seu conhecimento retira parte do entretenimento de seguir esta história. De certa forma, é percetível o porquê de o terem revelado, pois publicitar esta longa-metragem sem o fazer seria complicado. No entanto, o filme não devia ser comprometido pela revelação e a trama deveria conseguir manter-se em pé apenas com o suspense e mistério da fuga de Cooper.
O filme está, essencialmente, dividido em duas partes, delineando grandes diferenças artísticas entre as duas. A primeira foca em toda a armadilha e o escape da personagem do recinto através de uma realização inteligente e cómica. Já a segunda, acompanha o percurso de Cooper de uma forma mais séria e genérica, aproveitando isso para dar a conhecer o ambiente familiar e as razões emocionais de Cooper.
No recinto, o seguimento dos planos de Cooper é excitante e engajador. Apesar de em muitas ocasiões as soluções que ele encontra e as situações em que está inserido fazerem o espectador pensar isto seria muito improvável, tem uma margem de credibilidade suficiente para o público se investir na diversão da trama. Parte dessa margem de credibilidade está no facto de Cooper ser um homem branco, algo de que o guionista está bem ciente. Para além desta crítica social, o filme aproveita o contexto em que está inserido para fazer outros comentários relevantes sobre certas dinâmicas sociais. Tal como o aspeto comunitário da cultura de fandom e a dificuldade do crescimento da nova geração numa era tão tecnológica.
Assim que as personagens se retiram do recinto, o tom do filme muda e é-nos forçado pela goela abaixo a personagem Lady Raven. A inclusão da artista durante o resto do filme foi desnecessária e não adicionou nada de relevante à história. Em vez de arrumá-la e não sobrecarregar o enredo, a personagem é apresentada mais pessoalmente e envolvida no apanho de Cooper. A escolha desta inclusão torna-se difícil de justificar senão pelo facto da personagem ser interpretada pela filha do realizador e ela mesma ter uma carreira musical para promover.
No entanto, Lady Raven não é a única culpada pelos insucessos do filme. Aliás, é de enaltecer uma das suas cenas, a qual em que a artista está em direto no Instagram. Ao mesmo tempo que demonstra compreensão, por parte do realizador, do mundo que está a refletir, aponta um humor perspicaz. Uma outra série de problemas vieram com a Lady Raven, descarrilando a trama. Toda a criatividade e perspicácia existente na ideia inicial não conseguiu esticar-se para o cenário urbano do filme. Tanto a história familiar de Cooper, como o seu jogo com a polícia, tornaram-se aborrecidos e pouco capazes de captar interesse – rapidamente, Trap transformou-se num filme policial genérico. Quando todo o charme e bom planeamento do conceito inicial fica perdido, a única coisa capaz de captar o interesse é a atuação de Josh Hartnett.
Hartnett demarca-se como a melhor componente do filme através da sua atuação envolvente e inquietante. Desconcerta por completo o ambiente e guia a tensão do filme quase inteiramente por si mesmo, a prova mais transparente disso está na segunda metade da longa. Cooper é um psicopata, logo, a maneira dele interagir com as pessoas é através de uma farsa não muito convincente. Não tem um carisma inato, mas sim um sorriso e uma simpatia desnatural e tal é extremamente sentido pelo espectador. Tanto que uma crítica popular ao filme é a acreditação da atuação de Hartnett como não convincente por acharem a maneira de Cooper interagir com as pessoas anormal. Esta crítica acaba por ser um testamento ao sucesso da representação do ator. De tal forma entendeu a personagem que a sua interpretação foi capaz de ser multidimensional.
Trap acaba por deixar o espectador com um sentimento agridoce, causando uma maior frustração do que se simplesmente tivesse sido um filme mau. De tal forma, realça a importância de um guião forte e consistente e relembra que não dá para depender somente de uma boa ideia para fazer a magia acontecer.
Realização: M. Night Shyamalan
Argumento: M. Night Shyamalan
Elenco: Josh Hartnett, Ariel Donoghue, Saleka Shyamalan, Alison Pill e Hayley Mills
2024
Estados Unidos da América
Novembro 18, 2024
WOAH! Amei. Bastante. Nunca pares de fazer o que fazes. És brilhante.