No meio da guerra de audiências, a ética e a moral são passadas para segundo plano e o único foco passa a ser atrair e agradar o público. Títulos chamativos e imagens escandalosas são a forma mais fácil de o fazer. As notícias são transformadas em produtos e a troca de informação transforma-se num mercado, perde-se o critério e o principal objetivo passa a ser gerar o máximo de lucro possível.
Não é novidade que o jornalismo português, e também mundial, padece de muitos problemas. O sensacionalismo é uma das grandes maleitas. Desta palavra, entende-se por definição, de um modo simplista, a divulgação de notícias exageradas ou que causem sensação. Os jornalistas que o fazem têm como principais “armas” os títulos e as imagens chocantes, que despertam na população os seus instintos mais primitivos.
Apropriando-me das palavras de Pedro Machado, cronista do Correio do Minho, o jornalismo sensacionalista caracteriza-se pela “capacidade de induzir o público a prender-se a determinados factos, deturpando a realidade, pela forma forma como os apresenta”, pela forma como “coloca uma lupa sobre um determinado facto e o amplia”, “por manipular informação de modo incompleto ou parcial e apresentar essa informação num formato exagerado ou enganador”, ou ainda por transmitir a “certeza de verdade absoluta em determinados factos, quando o que se tem são opiniões, hipóteses, casos isolados”.
Todos os jornalistas devem obedecer a um código deontológico. Onde se encontram os seguintes mandamentos: “O jornalista deve relatar os factos com rigor e exatidão e interpretá-los com honestidade” e “O jornalista deve combater o sensacionalismo”. O grande problema é que, da forma que se pratica jornalismo atualmente, os agentes noticiosos veem-se quase obrigados a desrespeitar esse código.
A transmissão de informação transformou-se numa luta para ver quem consegue chegar a mais pessoas, mais rápido. A preocupação passou de “instruir a população” para “EU é que tenho de instruir a população”. Para atrair o maior número de pessoas, é preciso “dar ao povo aquilo que o povo gosta” e, infelizmente, o povo gosta de títulos exagerados e imagens impressionantes. Somos todos assim, mesmo que não o queiramos admitir. Desperta-se em nós esse tal instinto primitivo, da mesma forma que todos abrandamos para ver melhor um acidente na estrada.
Em termos de proximidade temporal, podemos falar da pandemia causada pela Covid-19. Nessa altura, vários meios de comunicação de todo o mundo tiraram proveito do medo, da incerteza e da fragilidade do estado psicológico da população. Todos os dias éramos constantemente bombardeados com notícias e dados estatísticos sobre o número de mortes e sobre o progressivo aumento da gravidade da doença. Sem querer desvalorizar a seriedade do problema, os meios de comunicação social conseguiram com que o Covid-19 parecesse ainda mais grave do que aquilo que já realmente era.
Na sua tese de mestrado, Lindsey Lowe, aluna da Universidade Estatal de San Jose, nos Estados Unidos da América, defende que a constante exposição a notícias sensacionalistas sobre um determinado tema leva a uma progressiva dessensibilização em relação a esse mesmo assunto. Isto faz com que seja necessário produzir notícias cada vez mais chamativas e exageradas, para que seja possível continuar a atrair o público.
Por meio de contacto com algumas pessoas que me são próximas, consigo perceber nitidamente os efeitos que este “medo” teve e tem no seu estado psicológico. Mais de um ano depois de ter sido decretado o fim da pandemia pela Organização Mundial de Saúde, o grau de preocupação continua igualmente elevado. Por outro lado, algumas pessoas ficaram tão desgastadas, que deixaram de se importar. Assim se vê a tal dessensibilização de que Lindsey Lowe fala.
A guerra da troca de informação está cada vez mais nítida e não mostra sinais de um fim. Cabe-nos ser a mudança e lutar a favor do nosso bem-estar intelectual e psicológico. Trocar de canal quando percebemos que só estão à procura de uma reação emocional, não ler um jornal quando a capa não se foca nos factos importantes, não clickar numa notícia quando é claro que o nosso click é tudo o que querem. A mudança começa com estes pequenos atos de protesto e começa com cada um de nós.