Jovens escritoras lusófonas evidenciaram a importância da sua liberdade de expressão nos dias atuais.

Na tarde de domingo, 17 de novembro, o auditório do Espaço Vita recebeu a mesa de debate “Um Quarto Só Nosso”, no âmbito da segunda edição do Festival Literário Utopia. Com a moderação de Afonso Borges, a sessão contou com a participação de três autoras contemporâneas: Aline Bei, Madalena Sá Fernandes e Maria Francisca Gama.

Joana Gomes

A conversa em torno do papel das mulheres na literatura pôs em evidência a inspiração do clássico Um Quarto Só Seu, de Virginia Woolf. “Remete para aquele quarto que é fechado enquanto escrevemos e aberto quando é publicado”, destacou Maria Francisca Gama.

A escritora leiriense de 27 anos, autora de A Cicatriz e A Profeta, confessou que escreve sobre aquilo que mais a apoquenta. Maria Francisca Gama não tem “medo de contar o que se passa com a porta fechada, sabendo que se vai abrir”. Gama salientou que “a escritora não se deve distinguir da pessoa”, partilhando ainda que cada vez mais leitores têm vontade de ler histórias de quem vive vidas como as suas.

Madalena Sá Fernandes voltou a trazer à conversa a obra de Woolf, comparando o panorama literário do início do século XX com o atual. A escritora destacou que ainda hoje se pensa que “o pensamento de uma mulher incomoda e deve ser mantido em segredo no seu quarto”, pelo que a escrita do seu livro Leme foi uma necessidade.

Já Aline Bei focou-se no dever de “manutenção do espaço já conquistado” pelas mulheres na literatura. Segundo a autora brasileira, a escrita de um livro implica a renúncia de grande parte da vida externa. “Mas nenhuma de nós faz nada sozinha”, sublinhou: “estamos acompanhadas pelas autoras que vieram antes.” Mesmo que se continue a achar que só um livro genial justifica que uma mulher se afaste da sua rotina, como indicou Bei, “devemos escrever pela escrita em si”.

No seu momento final, o debate entre as autoras debruçou-se na sensação de poderem inspirar raparigas mais jovens e na forma como a violência é retratada nas obras de todas. Madalena Sá Fernandes destacou a ancestralidade do papel das mulheres na literatura. A escritora destacou que as figuras femininas, ao contarem histórias enquanto costuravam, influenciaram termos com os quais nos referimos a livros como “desenlace” e “fio da história”.

Aline Bei, por sua vez, realçou que “a própria escrita é violência”, algo que demonstra nos seus romances, marcados pelo espaçamento entre parágrafos e palavras. Maria Francisca Gama concluiu que a própria experiência de ser alegre é diferente entre as mulheres e os homens, encorajando a que, para além de reflexões profundas, “sejam contadas pelas mulheres histórias mais banais, já que os homens também as contam e publicam”.