Filmes de animação: os filmes reconfortantes, que aquecem o coração com nostalgia. Entristece saber que nunca mais os olharemos com a alma inocente da criança que outrora fomos. Entristece, ainda mais, ver que os desvalorizamos, sem pensar no impacto que pode ter em nós, adultos. Pelo menos, se não estivermos dispostos a isso.

É precisamente na viagem entre desenhos e personagens fictícias que podemos resgatar o que, porventura, perdemos há muito tempo: a simplicidade, a inocência, a pureza – que agora está mais contaminada do que nunca.

As crianças são melhores pessoas por isso mesmo. São um ser puro à espera de ser moldado pela sociedade – sociedade essa, sedenta por distorcer visões. São melhores pelo simples facto de terem os valores bem assentes, por se comoveram com histórias de um outro mundo, diferente do seu. São, muitas vezes, os impulsionadores de outros contos, os criadores de algo novo. Sentem de maneira diferente, porque veem de maneira diferente.

Há quem diga que ninguém nasce preconceituoso, nem com maldade. A sociedade e as vivências de cada um é que roubam o brilho da vida, que até então estava isenta da influência de outrem.

Os filmes de animação têm um papel crucial na vida das crianças. São elas, também, que ao assisti-los, o fazem sem preconceitos, com disposição para absorver tudo. São levadas a sonhar, a amar o próximo, a perceber o que é errado. Choram e riem. Tomam consciência dos valores universais e da beleza que é viver num mundo rico de culturas e hábitos.

Mulan, Pocahontas, Aladino, por exemplo, representam um povo, dão a conhecer os seus costumes, os seus hábitos. Algumas crianças identificam-se, outras aprendem, mas todas retiram o que de melhor o filme tem para oferecer.

Mufasa: O Rei Leão foi lançado recentemente. Trouxe de novo a história que marcou a infância de tantos e deu-lhe uma nova perspetiva, focada agora na vida do pai de Simba.

Ao ver o filme é quase impossível não verter uma lágrima. A história entranha-se e mexe com a pessoa que somos. Permite-nos redescobrir uma parte de nós, que estava silenciada. Chega a ser nostálgico até.

Eis que surge a questão: serão os filmes de animação apenas para crianças? Será atrevimento dizer que “não”? É indiscutível as marcas que o tempo imprime na nossa maneira de perspetivar seja o que for. Certo é que Mufasa: O Rei Leão vai ser encarado de forma diferente pelos adultos e pelas crianças.

Repara-se então em todos os pormenores. Uma história com um enredo exagerado que facilita a empatia, a jornada de um herói, o humor simples, a viagem construída por seres tão diferentes de nós.

No entanto, a premissa será sempre a mesma. Uma história de amor, agora entre Sarabi e Mufasa; o humor simples, mas, surpreendentemente, reconfortante de Timon e Pumba; a história de dois irmãos que se afastam; a traição de Taka; e a emergência de Scar. Nem mesmo um adulto fica indiferente a tal.

Se se permitir, sempre serão resgatados sentimentos. A nostalgia tem esse efeito e, por isso, os filmes de animação também. As crianças podem fortalecer, através do visionamento dos mesmos, valores de amizade, amor, empatia… Os adultos poderão, de igual forma, recordar sentimentos que foram perdendo propósito ao longo dos anos, ou talvez analisá-lo num tom mais introspetivo (depende da forma como querem alimentar a sua mente).

O filme Soul retrata muito bem isso. Por ser denso, as interpretações que se fazem do mesmo podem variar, consoante a fase da vida ou a idade do espectador. As crianças podem aprender várias lições, como: a simplicidade da vida; a coragem de seguir o talento e as paixões que têm; a persistência. Para além destas, os ensinamentos podem assumir outras formas para os adultos, como: a reflexão sobre o propósito e significado da vida; a dádiva de se viver o presente, sem desejar algo mais; ou até, ser um impulsionador para uma descoberta pessoal.

Há que arriscar e escolher ver um filme destes. Vá, de vez em quando. Contrariar o molde que a sociedade nos impingiu e ver uma obra com a alma aberta. Mais do que isso. A animação é um terreno fértil para construir histórias marcantes. É uma forma de arte a vários níveis e temos de a encarar como tal, com o devido respeito. Há estilos de desenhos que agradam mais a uns e a outros nem tanto. Resume-se tudo, então, à procura do que causa maior agrado.

No fundo, é um legado. Pais que viram o Rei Leão, vão, agora, ver a história de Mufasa com os seus filhos. Vão entrar no mundo deles. Revisitar a infância e criar laços. É algo intergeracional. E quem fala no Rei Leão, fala no Bambi, Livro da Selva, Dumbo, À Procura de Nemo…

De notar, também, que o humor nestes filmes, nem sempre, é o mais apropriado para crianças. Passar-lhes-á ao lado. Isto é a prova de que não há um público restrito para este estilo cinematográfico. Zootrópolis da Disney é o exemplo disso, com o seu humor mascarado e inteligente.

Na realidade, é a magia de encontrar sempre algo novo, cada vez que nos propomos a ver um filme já visto. Nem que seja um detalhe, uma piada – algo que mude o rumo da história e nos desconstrua a mente, para algo mais profundo.

Sendo obras intemporais, com necessidade de serem revisitadas ao longo dos anos ou produções lançadas recentemente, com certeza, retiraremos novos ensinamentos. E, por meros momentos, voltaremos a encontrar a nossa criança interior.