Há uns anos íamos ao cinema, a um concerto ou ao teatro. Hoje, abrimos o telefone e damos scroll infinito em redes sociais que pouco estimulam o nosso sentido crítico. Será esta a modernização de lazer e da cultura?
É imperativo afirmar que a revolução digital tem afetado, quase de forma indiscutível, a atenção e concentração do ser humano e, consequentemente, a forma como consumimos conteúdo. Entre as plataformas digitais mais utilizadas está o TikTok. São vídeos curtos, em média de 15 segundos, com músicas e edições aceleradas que circulam numa página de acordo com os nossos interesses e algoritmo.
Enquanto estudamos, trabalhamos ou socializamos, a capacidade de nos concentrarmos e executar uma tarefa a longo prazo torna-se cada vez mais difícil. Persiste, sempre, a tentação de nos distrairmos com vídeos, através de uma dose de dopamina que dura poucos breves segundos. E será este o novo vício, socialmente aceite, da época contemporânea?
Vivemos num mundo onde o tempo parece passar mais depressa, mas, paradoxalmente, gastamos horas infindáveis a deslizar o dedo sobre o ecrã do telemóvel. O TikTok, com os vídeos curtos e cativantes, tornou-se o emblema do imediatismo das redes sociais. Este ciclo de recompensas rápidas tem impacto na forma como processamos informação e tomamos decisões. Notícias complexas são resumidas em clipes de 60 segundos, debates profundos transformam-se em soundbites virais, e até questões sociais ganham maior atenção por meio de trends acompanhadas por danças ou músicas do momento. Por um lado, é uma democratização da informação, onde qualquer pessoa pode criar e compartilhar conteúdo. Por outro, o risco de superficialidade é evidente, com factos fora de contexto e uma atenção cada vez mais efémera
Somos completos reféns das redes sociais. Sabem o que gostamos, onde estamos, o que fazemos e de quem somos amigos. Damos todas estas informações de mão beijada sem sequer avaliar o peso daquilo que recebemos em troca. O imediatismo destes meios tem-me assustado cada vez mais. Bastam alguns segundos para o algoritmo nos envolver numa espiral de vídeos personalizados, muitas das vezes com situações semelhantes às que nos acontecem. Parece que foram pensados a dedo. Quem nunca começou a ver “só mais um vídeo” e, de repente, percebeu que passaram duas horas?
A situação agrava-se quando não conseguimos estar concentrados numa outra atividade, sem pegar no aparelho, nem que seja para ver as notificações pelas quais somos bombardeados constantemente. Fui ao cinema na semana passada. O filme era de duas horas, sem intervalo. Fiquei surpreso ao ver telas pela sala, durante todo o decorrer do filme. Não estavam a gravar ou a fotografar, estavam em redes sociais, a responder a mensagens. Até, porque, duas horas sem o fazer já é pedir muito.
E assim, a experiência coletiva de imersão no cinema, antes considerada quase sagrada, é interrompida por ecrãs brilhantes e notificações incessantes. A modernidade trouxe-nos um paradoxo intrigante: nunca estivemos tão conectados e, ao mesmo tempo, tão distantes do momento presente. As redes sociais, que prometiam unir, muitas vezes afastam-nos daquilo que é tangível, real e palpável. Mas será que estamos dispostos a pagar este preço? A perder a paciência para longas conversas, a capacidade de reflexão profunda e até o prazer de nos aborrecermos.
Talvez não seja uma questão de demonizar as redes sociais, mas de reaprender a usá-las. De redefinir os limites entre o consumo saudável e o vício. Precisamos de resgatar a capacidade de nos dedicarmos a algo, seja um livro, um filme ou uma conversa, sem a interrupção constante de notificações. Porque, no fundo, a cultura não se modernizou – apenas adaptou-se ao ritmo frenético que escolhemos viver. E cabe a nós decidir se queremos continuar a viver nesta dança apressada, ou se vamos desacelerar, desligar os ecrãs e redescobrir o prazer do silêncio, do foco e da verdadeira conexão.