A cultura portuguesa parece que rapidamente se está a dizimar, sendo substituída pelo que vem lá de fora. Porém, quando Ruy de Carvalho, o ator mais velho no mundo ainda a representar aos 98 anos de vida, declarou o seu amor à nossa cultura na Gala de 32 anos da TVI, naturalmente emocionou milhares de espectadores.
No entanto, parece haver uma luta constante para apoiar o que vem de nós, tornando a nossa arte em algo que parece sigiloso. Infelizmente, vemos que há uma preferência pelo estrangeirismo, algo que Fernando Pessoa já falava. Há um favoritismo por expressões do exterior e por seguir o que se faz internacionalmente, deixando para trás os conteúdos portugueses.
Não existe um grande apoio pela arte feita no nosso país, pouco se investe nos nossos artistas e poucos portugueses participam em atividades culturais. O negativismo português constrói o pensamento de que não temos nada de bom para oferecer, perdendo-se por aí tudo o que é feito. Desta forma, este desinteresse cultural é substituído por músicas estrangeiras, filmes relatados em inglês e bolhas estadunidenses.
Em Portugal, em termos musicais, não existe só o Hip Hop Tuga, mas também um universo inteiro a decorrer musicalmente, ao qual não se presta tanta atenção. Muitos artistas portugueses procuram pela visibilidade, podendo mesmo ser verdadeiros tesouros escondidos à espera do seu momento para se manifestar. Por vezes, encontram-se no Festival da Canção, um palco que celebra e preza pela partilha da música do país e que teve recentemente a sua final, no dia 8 de março.
Contudo, após a banda madeirense NAPA ganhar a representação portuguesa na Eurovisão deste ano, surge uma discórdia online do que é “ganhar a Eurovisão” e o que é necessário para mostrar “quem somos lá fora”. Mas, honestamente, ainda temos bastante para descobrir sobre “quem somos aqui dentro”. Além do mais, o mundo musical português é tão rico que, quando lhe damos uma pequena chance, queremos ouvir cada vez mais.
Quanto às obras cinematográficas, teatrais e animadas portuguesas, talvez sejam as artes que mais passam despercebidas em Portugal. Tanta vida que detêm, com tanto potencial e talento, mas também com uma grande falta de reconhecimento. O interesse pela literatura tem crescido ultimamente e, quando é escrito na língua portuguesa, é um vislumbre magnífico de palavras e emoções, que vão desde José Saramago até novos escritores.
O teatro e o cinema português têm várias pérolas escondidas e tantas histórias por contar, que não se devem apreciar só quando aparece uma nomeação internacional. Apesar de tendermos sempre a elevar mais o que é estrangeiro, e de muito se poder discordar, acredito que nos serve muito mais atribuir valor à nossa arte do que apenas nos sentirmos valorizados quando o exterior o faz.
Estes meios artísticos são uma caracterização de emoções e pensamentos, representam horas e horas de trabalho, de planeamento e um incrível apetite de criar. Tudo o que envolve a arte portuguesa é onde reside o mais alto nível de sentimento e coração. É algo que uma máquina nunca poderá substituir. Obviamente, não devemos deixar completamente de consumir o que é internacional, mas devemos deixar a nossa apatia de lado e abrir um espaço para tentar incluir-nos culturalmente em Portugal.
Por outro lado, sinto que há uma imensa curiosidade entre alguns portugueses. Existe uma crescente vontade de tentar encontrar um senso de pertença na própria língua. Desejo de apreciar, ouvir e rejeitar perder o que temos. E, pelas palavras de Ruy Carvalho: “Viva o teatro! E, viva ao espetáculo! E, viva a música! E, viva tudo o que é arte! E, viva a arca do tesouro que é a cultura portuguesa!”.