De 10 a 14 de junho, mais de 800 cidadãos e 60 artistas ocupam ruas, praças e espaços improváveis de Braga com arte participativa e pensamento crítico.
Braga vai transformar-se num grande palco comunitário e artístico entre os dias 10 e 14 de junho, com a realização do Desejar – Movimento de Artes e Lugares Comuns. Integrado na programação da Braga 25 – Capital Portuguesa da Cultura, o Desejar propõe-se a ser um “festival que não é um festival”, como definiu o diretor artístico Hugo Cruz, desafiando modelos tradicionais de produção e consumo cultural.
Com 13 criações originais, mais de 60 artistas de seis países e o envolvimento direto de 800 cidadãos bracarenses, o Desejar surge como um convite à imaginação coletiva, à criação partilhada e à ocupação dos espaços públicos por práticas artísticas e comunitárias. Todas as atividades são de acesso gratuito, ainda que algumas exijam inscrição ou levantamento de bilhete.
Durante a conferência de imprensa, Hugo Cruz afirmou que “desejar é um verbo político”. “O nosso objetivo é reabilitar o desejo enquanto motor de transformação, num mundo onde desejamos tudo ao mesmo tempo e, paradoxalmente, já não sabemos o que realmente queremos”, acrescentou.
O movimento arranca a 10 de junho, com a instalação da Assembleia em Estaleiro no Mercado Municipal de Braga, um espaço construído pelo Coletivo Til e pelos cidadãos da Assembleia do Desejar. Este será o ponto de partida e de chegada de cada dia. Lá serão acolhidos debates, performances, rituais e concertos, como o da rapper Mynda Guevara com jovens de Braga, logo na noite de abertura.
Outro momento marcante é a estreia de “85 755 t.”, uma criação da coreógrafa americana Allison Orr com os trabalhadores da AGERE, empresa municipal de resíduos, e o coletivo Plataforma do Pandemónio. O espetáculo, encenado num estaleiro, junta máquinas e gestos repetidos à arte do movimento e homenageia o “trabalho invisível, mas essencial” da recolha de lixo. João Gomes, representante dos trabalhadores da AGERE que participam na performance, explicou que “85 755 t. é o número de toneladas de resíduos recolhidos em Braga em 2023”. A administradora da AGERE, Alexandra Roger, sublinhou a importância do projeto como forma de dignificação: “estas pessoas fazem todos os dias um trabalho meritório e este espetáculo é uma forma de o mostrar e de o valorizar”.
O programa do Desejar inclui ainda a Academia do Desejar, um ciclo de conversas e partilhas entre organizações locais e internacionais ligadas à arte comunitária. Um dos destaques será a conferência da Diretora-Geral dos Direitos Culturais de Espanha, Jazmín Beirak. Abordará os direitos culturais como base de políticas públicas mais inclusivas. A ativista boliviana María Galindo apresenta, no dia 12 de junho, uma ação performativa intitulada “Como tirar do adormecimento o desejo de fazer revolução?”. Segue-se a exibição do filme Revolución Puta, estreado na Bienal de Veneza 2024.
Ao longo da semana, o público é também convidado a participar em três performances em percurso, que propõem novas leituras afetivas da cidade. Desde um passeio de bicicleta por Percursos Afetivos (com Cadu Cinelli), a uma visita guiada por crianças em Bloom&Doom (de Caterina Moroni), até à exploração do Rio Este como eixo de memória e ecossistema, com o coletivo Guarda-Rios. Outras estreias incluem “Da minha aldeia vejo quanto da terra se pode ver no universo”, com base em memórias de habitantes de Braga, e “Morada Aberta”, de Tânia Dinis, sobre mulheres historicamente vistas como bruxas e curandeiras.
Na conferência de imprensa, Joana Menezes Fernandes, Coordenadora Executiva da Braga 25, destacou que o Desejar representa “a essência do que se pretende com a Capital Portuguesa da Cultura: um processo de cidadania, partilhado e transformador”.
Também o representante e vice-presidente da Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Norte esteve presente na conferência de imprensa. Jorge Sobrado realçou que este movimento mostra que “a cultura não é para salões”, mas sim “para as praças, para as ruas, para a AGERE, para o quotidiano”. E reforçou que “o Desejar é arte com esperança e transformação”.
O programa termina a 14 de junho com a Parada do Desejar, que convida a cidade a celebrar os desejos individuais e coletivos. Segue-se “Golpe de Asa”, no Theatro Circo, um espetáculo com intérpretes LGBTQIA+ de Braga que cruza tradição, corpos e identidades.


