Marina Sena lançou o seu terceiro disco a solo. Após De Primeira (2021) ter catapultado a sua carreira e Vício Inerente (2023) ter direcionado a artista para grandes digressões e espetáculos, Coisas Naturais solidifica a arte da cantora.
Marina Sena tem uma das vozes mais únicas do pop brasileiro, podendo ser descrita como anasalada. Há que admitir, esta singularidade não agrada a todos. Porém, isso é ao nível subjetivo, porque, objetivamente, a técnica vocal de Sena é sólida. E atenção: as notas que a artista atinge e a sua pronúncia ficaram ainda mais claras com este novo álbum!
O timbre sem-par e as letras de pura poesia marcam a carreira de Sena. Neste novo projeto, a lírica ganha um papel de ainda maior destaque. Existem temáticas e símbolos presentes ao longo de todo o disco, como o amor, a Natureza, os astros, o processo de cura, o Carnaval, entre outros. É criada uma coesão entre as faixas – no entanto, não há uma narrativa que guia como o disco deve ser escutado. Não é um álbum com o qual o ouvinte se sinta obrigado a seguir o alinhamento apresentado.
Quem olha para o título Coisas Naturais é levado a imaginar que o álbum terá uma grande presença de acústicos, de um som mais cru. As primeiras duas canções enganam o ouvinte ao seguir essa linha de pensamento. Os instrumentais de “Coisas Naturais” e “Numa Ilha” são “gostosinhos” de se escutar, devido especialmente ao uso de flautas e da percussão. Transmitem um som tropical e exótico, tão natural da discografia de Marina Sena.
Porém, este disco tem imensos momentos mais experimentais, em que se misturam géneros e são explorados quer o agradável, quanto o ruído. Imediatamente na terceira faixa, “Desmitificar”, é-se surpreendido: é feita uma mescla entre instrumentos tradicionais com sintetizadores; são aplicados efeitos e distorções à voz… E tudo culmina num build-up durante a ponte, o ponto alto da canção.
Outra música a ressaltar seria a penúltima faixa que, neste caso, é uma exploração para saber o que ocorre quando se junta samba com funk. O resultado é “Carnaval”, uma canção em que é muito bem aproveitado o único minuto de duração.
Em Coisas Naturais nota-se com intensidade as influências por trás da arte de Sena. Uma das suas grandes inspirações é Gal Costa e o legado desta é homenageado na integridade do álbum, já a começar na capa e no aspeto visual. O destaque recai naquarta faixa, “Anjo”, que relembra sonoramente êxitos de Gal, em especial pelo grito de Marina no final.
Nas canções “TOKITÔ” e “Doçura” estão presentes convidados como Çantamarta, GAIA e a conhecida dos portugueses Nenny. Marina Sena soa melhor a solo do que acompanhada por participações especiais. As canções com featurings são agradáveis, mas não chegam ao mesmo nível que outras em que apenas Sena canta.
Um tema que se realça no disco é “Lua Cheia”. A oitava faixa é contagiante, uma pisadinha com uma letra romântica, que evoca uma noite fresca de verão. Não dá para ficar quieto a ouvi-lá! Aliás, todo o projeto é bastante dançável, de vibrações positivas e alto astral.
À primeira escuta, o álbum pode não ser muito impactante, mas fica-se com o gosto de querer ouvir mais vezes. Com o tempo, as faixas parecem amadurecer. É daqueles casos em que primeiro estranha-se, depois entranha-se.
A identidade visual de Coisas Naturais é excelente e distinta, exalando um tanto à corrente do realismo mágico e também do movimento tropicália. Já era expectável uma estética muito forte, tendo em conta o que foi feito nos dos últimos dois discos – Sena deixou o público mal-habituado e a criar altas expectativas.
O começo do álbum é ótimo. A meio parece ficar “perdido”, com faixas um tanto esquecíveis.Talvez a ordem dos temas pudesse ser diferente, ajustada para que músicas com melodias parecidas estivessem mais próximas. Assim, não se criavam contrastes exagerados.
A segunda parte o disco melhora aos poucos, até terminar com chave de ouro… Ou, aliás, com chave de “Ouro de Tolo”.
O single tem fragmentos apenas ao som da guitarra clássica, outros com orquestra, uns com arranjo de bossa nova e ainda alguns mais eletrónicos. A letra contém versos “afiados” e é um tanto mística. A voz de Marina Sena está belíssima, atingindo graves e agudos impressionantes. “Ouro de Tolo” diferencia-se do resto da discografia de Sena graças a curta declamação de um poema como ponte – algo de extrema originalidade.
Coisas Naturais acaba de forma incrível. Tem um ótimo final, que deixa uma porta aberta para futuros discos de alta qualidade por parte de Marina Sena.
Nome: Coisas Naturais
Artista: Marina Sena
Data de Lançamento: 31 de março de 2025
Editora Discográfica: Sony Music Entertainment Brasil