Escrevo este texto em dia de eleições. Os portugueses mobilizam-se às urnas para exercer o direito mais representativo de uma democracia. Todos temos uma voz, uma oportunidade para eleger um “voto de confiança” nos decisores que poderão lutar com mais veemência pelos interesses de cada um. Bem, boa parte da minha atenção vincula-se à importância que os partidos atribuem à promoção da atividade física e ao reforço da oferta desportiva. Questiono-me, por isso, sobre que grau de relevância atribuem a esta área de tal forma crucial para a saúde pública.

Antes de mais, vale ressalvar a progressiva necessidade de falar de desporto em Portugal. Especialmente quando, mesmo com vários indicadores de atividade desportivas abaixo da média da União Europeia, conseguimos obter excelentes resultados nas competições internacionais. Basta, por exemplo, destacarmos a participação do ano passado como a melhor de sempre em Jogos Olímpicos, com quatro medalhas arrecadadas. Estas grandes conquistas tornam-se pequenas quando percebemos que o país poderia estar bem adiante nesta conversa caso houvesse um investimento, acima de tudo, preocupado na prática desportiva. Até lá, vamos celebrando e esquecendo o atraso que fomos exibindo nos últimos anos, como se nos estivessem a atirar areia para os olhos.

O Eurobarómetro de 2022 apresentou Portugal como o país que mais habitantes teve a revelarem nunca praticarem atividade física. Três em cada quatro portugueses diz ter outras prioridades. Eu não os culpo. Da mesma forma que não julgo uma criança que encosta os vegetais no canto do prato. Se ninguém esteve lá para alertar o cidadão para a relevância de tomar uma vida ativa, torna-se natural que este não a tome como uma prioridade.

Tudo se agrava quando analisamos o valor depositado por habitante para alimentar este setor. Em média, cada cidadão vê nele investidos cerca de 40€ (segundo dados do INE relativos a 2023), com a média da União Europeia a fixar-se nos 113€. No total, os municípios gastaram 426,5 milhões de euros, o correspondente a 3,6% da sua despesa total. São provas de que o problema tem origem na base, numa falta de cultura desportiva e de valorização dos seus efeitos.

Tomando tudo isto em consideração, passo, então, a destacar o posicionamento dos candidatos à Assembleia da República. Primeiro, apontando as principais medidas que separam os partidos dos seus adversários. Por fim, abordarei alguns pontos de extrema importância para o desporto nacional que, de certa forma, são avaliados de forma semelhante nos programas analisados. Ora, faço-o, talvez, de forma tardia. Admito. Contudo, nunca será tarde para discutir a forma como o país é – e será – gerido.

 

O que distingue cada partido? Quais as bandeiras que envergam?

 

Para a Aliança Democrática (AD), trata-se, acima de tudo, de um problema estrutural. Direciona, por isso, as suas propostas para uma reorganização de muitas áreas de atividade desportiva, propondo a implementação de um “Plano Estratégico” para o efeito. Por sua vez, pretende estabelecer contactos com federações desportivas, a comunidade educativa, os municípios e outros agentes desportivos para “desenhar estratégias para o desenvolvimento integrado do desporto”, de modo a perceber tendências que possam moldar esses planos.

O Partido Socialista (PS) impõe a meta de 1 milhão de praticantes desportivos federados até 2030. Seria um aumento de 226 155 atletas. Para isso, pretende definir um “plano estratégico plurianual de desenvolvimento desportivo”. O PS avança também com a proposta de estimular a qualificação de ex-atletas olímpicos com a atribuição de bolsas aos que viram a sua vida académica afetada pela desportiva.

O Chega adiciona o desporto ao seu pacote anticorrupção, assegurando “o combate sem tréguas à corrupção desportiva”. Além disso, manifesta a vontade de aproximar o Desporto Escolar e Universitário, através da criação de sistemas nacionais e regionais de competição, numa abordagem “similar ao modelo americano”.

A IL propõe “eliminar o monopólio da Federação Portuguesa de Futebol na formação de treinadores”, possibilitando o “reconhecimento da formação de treinadores efetuadas através de entidades privadas”. Os liberais também se isolam ao defenderem a hipótese de atletas olímpicos ingressarem nas Forças Armadas ou de Segurança Pública após o término das suas carreiras.

Bloco de Esquerda (BE) quer 1% do Orçamento do Estado para as despesas com a atividade física e o desporto. Em 2025, apenas 0,041% do valor da verba total se destinou a este setor. Relativamente ao regime legal, o BE quer garantir que os clubes e os seus associados detenham, obrigatoriamente, 51% dos direitos económicos e desportivos de uma sociedade desportiva.

A CDU quer um Estado ativo na formação de treinadores, técnicos e dirigentes, tanto pelo financiamento como pelo estímulo. A coligação alveja, também, que a medicina desportiva seja incluída como elemento constituinte da política nacional de saúde, a par da implementação de uma Campanha de Promoção do Desporto no Trabalho.

O Livre levanta a questão da sub-representação feminina no setor e nos órgãos de decisão das instituições de maior poder, defendendo a promoção de uma abordagem equitativa. Quer, também, que haja uma redistribuição do financiamento público que combata assimetrias e injustiças entre federações desportivas.

Por último, o PAN posiciona-se como o único partido que propõe adotar uma estratégia nacional de sustentabilidade ambiental para o desporto, especialmente no que diz respeito às emissões carbónicas. O Pessoas-Animais-Natureza consta como o único partido a lutar para interditar a caça e pesca lúdica e desportivas.

 

Em que convergem os partidos?

 

Comecemos por um indicador positivo. Praticamente todos os programas eleitorais apontam o desporto como uma ferramenta de inclusão e de combate à discriminação social.

À Esquerda, todos propõe uma aposta na rede e meios do Desporto Escolar. O Bloco de Esquerda realça a necessidade de capacitar as escolas de docentes dotados e de modernizar os espaços de atividade física nas escolas públicas. Livre e CDU ressalvam o valor educativo desta vertente desportiva, apelando à aposta no reforço da participação. O PS refere apenas querer “aumentar o investimento no Desporto Escolar”.

Ainda na atividade física escolar, relativamente à disciplina de Educação Física, a Iniciativa Liberal sugere aumentar o tempo semanal no horário escolar, enquanto o PAN defende a formação de professores especializados.

Chega e Iniciativa Liberal posicionam-se quanto a matéria de impostos para o setor. Os primeiros sugerem a redução do IVA na venda de bilhetes para espetáculos desportivos federados e na aquisição de equipamentos e serviços desportivos. A IL quer a isenção de IVA e ISV na compra de veículos adaptados para as sociedades e federações desportivas sem fins lucrativos e IPSS. São, também, partidos que convergem na vontade de apostar no reconhecimento dos E-Sports a nível nacional.

Também o PAN aborda o regime fiscal, pretendendo alargar os apoios reconhecidos aos atletas paralímpicos para os seus parceiros de competição e guias e para a compra de viaturas adaptadas.

Metade dos partidos com assento parlamentar sugere uma revisão da Lei de Bases da Atividade Física e do Desporto. AD e PS apenas apontam para esta necessidade, enquanto Chega sugere uma “reforma no modelo de financiamento do desporto” e o Livre atenta na exigência da “promoção da saúde física e mental e da Literacia Física ao longo da vida”.

 

Ainda não é suficiente

 

Voltamos ao mesmo. Há sete meses, também num editorial, alertei para a necessidade de valorizar a atividade física e desportiva com um financiamento mais robusto e capaz de catapultar Portugal para um caminho de promoção de hábitos de vida saudáveis. Ora, poucos candidatos destacam a evolução no financiamento do desporto nacional como imprescindível, voltando antes a sua atenção para uma revisão da estrutura do setor e para a forma como os órgãos responsáveis devem atuar.

Contudo, podemos, pelo menos, sorrir com uma aparente valorização do papel que o desporto tem perante exigências sociais de saúde pública. Muitos partidos demonstram-se atentos aos fracos registos do país quanto à atividade física nos quadros da União Europeia, bem como dos efeitos que poderão estar associados a uma aposta efetiva no setor. No entanto, infelizmente, referir que temos um problema não é suficiente.

Espero estar enganado, mas, por este andar, continuarei a escrever sobre o assunto por mais uns tantos anos.